Hoje temos a oportunidade de
publicar um artigo escrito pelo irmão Augustus Nicodemos Lopes tratando desse
controverso tema que é a participação dos crentes nas chamadas “festas
juninas”. O material original foi publicado no site do autor original do artigo, que pode ser acessado pelo
link abaixo:
Sobre Festas Juninas
por Augustus Nicodemus
Lopes
Mas o Espírito expressamente
diz que nos últimos tempos apostatarão alguns da fé, dando ouvidos a espíritos
enganadores, e a doutrinas de demônios; Pela hipocrisia de homens que falam
mentiras, tendo cauterizada a sua própria consciência; Proibindo o casamento, e
ordenando a abstinência dos alimentos que Deus criou para os fiéis, e para os
que conhecem a verdade, a fim de usarem deles com ações de graças; Porque toda
a criatura de Deus é boa, e não há nada que rejeitar, sendo recebido com ações
de graças. Porque pela palavra de Deus e pela oração é santificada›› (1Tm 4.1-5
– ACF)
A festa celebra o nascimento de
João Batista, que virou um dos santos católicos. É realizada no dia 24 de junho
com base no fato que João Batista havia nascido seis meses antes de Jesus (Lc
1.26,36). Se o nascimento de Jesus (Natal) é celebrado em 25 de dezembro, então
o de João Batista é celebrado seis meses antes, em 24 de junho. É claro que
estas datas são convenções, apenas, pois não sabemos ao certo a data do
nascimento do Senhor.
A origem das fogueiras nas
celebrações deste dia é obscura. Parece que vem do costume pagão de adorar seus
deuses com fogueiras. Os druidas britânicos, segundo consta, adoravam Baal com
fogos de artifício. Depois a Igreja Católica inventou a história que Isabel
acendeu uma fogueira para avisar Maria que João tinha nascido. Outra lenda é
que na comemoração deste dia, fogueiras espontâneas surgiram no alto dos
montes. Já a quadrilha tem origem francesa, sendo uma dança da elite daquele
país, que só prosperou no Brasil rural. Daí a ligação com as roupas caipiras.
Por motivos obscuros acabou fazendo parte das festividades de São João. Fazem
parte ainda das celebrações no Brasil (é bom lembrar que estas festas também
são celebradas em alguns países da Europa) as comidas de milho – provavelmente
associadas com a quadrilha que vem do interior – as famosas balas de “Cosme e
Damião.” São realizadas missas e procissões, muitas rezas e pedidos feitos a
São João. As comidas são oferecidas a ele. Se estas festividades tivessem
somente um caráter religioso e fossem celebradas dentro das igrejas como se
fossem parte das atividades dos católicos, não haveria qualquer dúvida quanto à
pergunta, “pode um evangélico participar?” Acontece que as festas juninas foram
absorvidas em grande parte pela cultura brasileira de maneira que em muitos
lugares já perdeu o caráter de festa religiosa. Para muitos, é apenas uma festa
onde acendem-se fogueiras, come-se milho preparado de diferentes maneiras e
soltam-se fogos de artifício, sem menção do santo, e sem orações ou rezas feitas
a ele.
Paulo enfrentou um caso
semelhante na igreja de Corinto. Havia festivais pagãos oferecidos aos deuses
nos templos da cidade. Eram os crentes livres para participar e comer carne que
havia sido oferecida aos ídolos? A resposta de Paulo foi tríplice:
1. O crente não deveria ir ao
templo pagão para estas festas e ali comer carne, pois isto configuraria culto
e, portanto, idolatria (1Co 10.19-23). Na mesma linha, eu creio que os crentes
não devem ir às igrejas católicas ou a qualquer outro lugar onde haverá oração,
rezas, missas e invocação do São João, pois isto implicaria em culto idólatra e
falso.
2. O crente poderia aceitar o
convite de um amigo pagão e comer carne na casa dele, mesmo com o risco de que
esta carne tivesse sido oferecida aos ídolos. Se, todavia, houvesse alguém
presente ali que se escandalizasse, o crente não deveria comer (1Co 10.27-31).
Fazendo uma aplicação para nosso caso, se convidado para ir a casa de um amigo
católico neste dia para comer milho, etc., ele poderia ir, desde que não
houvesse atos religiosos e desde que ninguém ali ficasse escandalizado.
3. E por fim, Paulo diz que o
crente pode comer de tudo que se vende no mercado sem perguntar nada. A exceção
é causar escândalo (1Co 10.25-26). Aplicando para nosso caso, não vejo problema
em o crente comer milho, pamonha, mungunzá, etc. neste dia e estar presente em
festas juninas onde não há qualquer vínculo religioso, desde que não vá
provocar escândalos e controvérsias. Se Paulo permitiu que os crentes comessem
carne que possivelmente vieram dos templos pagãos para os açougues, desde que
não fosse em ambiente de culto, creio que podemos fazer o mesmo, ressalvado o
amor que nos levaria à abstinência em favor dos que se escandalizariam.
Segue abaixo parte de um livro
meu onde abordo com mais detalhes o que Paulo ensinou aos coríntios em casos
envolvendo a liberdade cristã.
O Culto Espiritual, Augustus
Nicodemus Lopes. Cultura Cristã, 2012.
A situação de Corinto era
diferente. O problema lá não era o mesmo tratado no concílio de Jerusalém. O
problema não era os escrúpulos de judeus cristãos ofendidos pela atitude
liberal de crentes gentios quanto à comida oferecida aos ídolos. Portanto, a
solução de Jerusalém não servia para Corinto. É provavelmente por esse motivo
que o apóstolo não invoca o decreto de Jerusalém. Antes, procura responder às
questões que preocupavam os coríntios de acordo com o princípio fundamental de
que só há um Deus vivo e verdadeiro, o qual fez todas as coisas; que o ídolo
nada é nesse mundo; e que fora do ambiente do culto pagão, somos livres para
comer até mesmo coisas que ali foram sacrificadas››.
1°. A primeira pergunta dos
coríntios havia sido: era lícito participar de um festival religioso num templo
pagão e ali comer a carne dos animais sacrificados aos deuses? Não, responde
Paulo. Isso significaria participar diretamente no culto aos demônios onde o
animal foi sacrificado (1Co 10.16-24). Paulo havia dito que os deuses dos
pagãos eram imaginários (1 Co 10.19). Por outro lado, ele afirma que aquilo que
é sacrificado nos altares pagãos é oferecido, na verdade, aos demônios e não a
Deus (10.20). Paulo não está dizendo que os gentios conscientemente ofereciam
seus sacrifícios aos demônios. Obviamente, eles pensavam que estavam servindo
aos deuses, e nunca a espíritos malignos e impuros. Entretanto, ao fim das
contas, seu culto era culto aos demônios.
Paulo está aqui refletindo o ensino bíblico do
Antigo Testamento quanto ao culto dos gentios:
Sacrifícios ofereceram aos
demônios, não a Deus... (Dt 32.17)
...pois imolaram seus filhos e
suas filhas aos demônios (Sl 106.37).
O princípio fundamental é que o
homem não regenerado, ao quebrar as leis de Deus, mesmo não tendo a intenção de
servir a Satanás, acaba obedecendo ao adversário de Deus e fazendo sua vontade.
Satanás é o príncipe desse mundo. Portanto, cada pecado é um tributo em sua
honra. Ao recusar-se a adorar ao único Deus verdadeiro cf. (Rm 1.18-25), o
homem acaba por curvar-se diante de Satanás e de seus anjos. Para Paulo,
participar nos festivais pagãos acabava por ser um culto aos demônios. Por esse
motivo, responde que um cristão não deveria comer carne no templo do ídolo.
Isso equivaleria a participar da mesa dos demônios, o que provocaria ciúmes e
zelo da parte de Deus (1Co 10.21-22). Paulo deseja deixar claro para os
coríntios “fortes”, que não tinham qualquer intenção de manter comunhão com os
demônios, que era a atitude deles em participar nos festivais do templo que
contava ao final. Era a força do ato em si que acabaria por estabelecer
comunhão com os demônios.
2°. Era lícito comer carne
comprada no mercado público? Sim, responde Paulo. Compre e coma, sem nada
perguntar(1Co 10.25). A carne já não está no ambiente de culto pagão. Não
mantém nenhuma relação especial com os demônios, depois que saiu de lá. Está
“limpa” e pode ser consumida.
3°. Era lícito comer carne na
casa de um amigo idólatra? Sim e não, responde Paulo. Sim, caso não haja, entre
os convidados, algum crente “fraco” que alerte sobre a procedência da carne
(1Co 10.27). Não, quando isso ocorrer (1Co 10.28-30).
O ponto que desejo destacar é que para o
apóstolo Paulo a carne que havia sido sacrificada aos demônios no templo pagão
perdia a “contaminação espiritual” depois que saia do ambiente de culto. Era
carne, como qualquer outra. É verdade que ele condenou a atitude dos “fortes”
que estavam comendo, no próprio templo, a carne sacrificada aos demônios. Mas
isso foi porque comer a carne ali era parte do culto prestado aos demônios,
assim como comer o pão e beber o vinho na Ceia é parte de nosso culto a Deus.
Uma vez encerrado o culto, o pão é pão e o vinho é vinho. Aliás, continuaram a
ser pão e vinho, antes, durante e depois. A mesma coisa ocorre com as carnes de
animais oferecidas aos ídolos. E o que é verdade acerca da carne, é também verdade
acerca de fetiches, roupas, amuletos, estátuas e objetos consagrados aos deuses
pagãos. Como disse Calvino: “Alguma dúvida pode surgir se as criaturas de Deus
se tornam impuras ao serem usadas pelos incrédulos em sacrifícios. Paulo nega
tal conceito, porque o senhorio e possessão de toda terra permanecem nas mãos
de Deus. Mas, pelo seu poder, o Senhor sustenta as coisas que tem em suas mãos,
e, por causa disto, ele as santifica. Por isso, tudo que os filhos de Deus usam
é limpo, visto que o tomam das mãos de Deus, e de nenhuma outra fonte”.
Que Deus abençoe a todos
Alexandros
Meimaridis
PS. Pedimos a todos os nossos leitores que puderem que “curtam” nossa
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Desde já agradecemos a todos.
Notas:
[1] Note que Paulo não teve qualquer problema
em anunciar o decreto em Antioquia, o que produziu muito conforto entre os
irmãos (At 15.30-31).
[2] Não somente Paulo, mas os
cristãos em geral tinham esse conceito. João escreveu: “Os outros homens,
aqueles que não foram mortos por esses flagelos, não se arrependeram das obras
das suas mãos, deixando de adorar os demônios e os ídolos de ouro, de prata, de
cobre, de pedra e de pau, que nem podem ver, nem ouvir, nem andar” (Ap 9.20).
[3] Cf. Charles Hodge, A
Commentary on 1 & 2 Corinthians (Carlisle, PA: Banner of Truth, 1857;
reimpressão 1978) 193.
[4] Hodge (1 & 2 Corinthians,
194) chama a nossa atenção para o fato de que o mesmo princípio se aplica hoje
aos missionários que, por força da “contextualização”, acabam por participar
nos festivais pagãos dos povos. Semelhantemente, os protestantes que participam
da Missa católica, mesmo não tendo intenção de adorar a hóstia, acabam
cometendo esse pecado, ao se curvar diante dela.
[5] João Calvino, Exposição de 1
Coríntios, em Comentário à Sagrada Escritura, trad. Valter G. Martins (São
Paulo: Paracletos, 1996) 320.
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