Este estudo é parte de uma Análise do Livro do
Gênesis. Nosso interesse é ajudar todos os leitores a apreciarem a rica herança
que temos nas páginas da História Primeva da Humanidade. No final de cada
estudo o leitor encontrará direções para outras partes desse estudo
O Livro do Gênesis
O Princípio de Todas as Coisas
בְּרֵאשִׁית בָּרָא אֱלֹהִים אֵת הַשָּׁמַיִם וְאֵת הָאָרֶץ
Eretz ha
ve-et Hashamaim et
Elohim Bará Bereshit
Terra a
e céus os
Deus criou princípio No
Gênesis 1:1
VII. Gênesis 3—11 —
PARTE B.
Como dissemos no estudo anterior — ver
a primeira afirmação da serpente dá a Eva uma perigosa
oportunidade de defender Deus. De tomar, por assim dizer, “Seu partido” e, com
isso, de tentar esclarecer, para a serpente, as posições de Deus. Uma tentação
permanente entre os humanos é esta: Tentação # 1 = falar em nome de
Deus! Pelas palavras da serpente,
em uma fração de segundos, a realidade de que Deus era um criador e provedor
gracioso e beneficente, deixa de ser verdade e precisa ser defendida. Eva
assume que a inferência feita pela serpente, de que Deus era, realmente, um ser
cruel e opressor de suas criaturas — pois não deixava as mesmas sequer se
alimentarem — precisava ser rebatida. Eva sai em defesa do Deus Todo-Poderoso,
mas de maneira que pode ser caracterizada, apenas como canhestra. Em Gênesis
3:2—5 nós temos aquilo que o teólogo alemão Dietrich Bonhoeffer chamou, de
forma bastante apropriada, de “a primeira conversa acerca de Deus”[1].
Dietrich Bonhoeffer
Versos
2 e 3: Respondeu-lhe a mulher: Do fruto das árvores do jardim podemos comer,
mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Dele não
comereis, nem tocareis nele, para que não morrais.
Eva retruca à insinuação da serpente com uma “verdadeira
afirmação”, com a qual procura responder tanto à admiração quanto à surpresa,
apresentadas na pergunta feita pela serpente — ver estudo anterior por meio do
link acima. Mas como dissemos, ao fazer a defesa de Deus, Eva o faz de maneira
desastrada. Por motivos diferentes daqueles utilizados pela serpente, a mulher
lança mão, exatamente, do mesmo tipo de recurso utilizado pela serpente: o
exagero. A primeira parte da afirmativa da mulher está 100% correta: ”Do
fruto das árvores do jardim podemos comer”.
Mas na segunda parte da resposta, aquela que trata de forma específica, do
acesso ao fruto do conhecimento do bem e do mal, a resposta da mulher contém
uma adição quando ela especifica que: com relação ao fruto proibido, eles não
deveriam apenas não comê-lo, mas não deveriam sequer tocar no mesmo. Ela
esticou a proibição — restrita a não comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal — um bocado
considerável, ao interpretar o “dela não comerás”,
de Deus, com o “nem tocareis nele”,
que acrescentou ao mandamento Divino. Esta é outra tentação permanente entre os
seres humanos: Tentação # 2 = colocar palavras na boca de Deus! As palavras de Eva podem ter
tido a intenção de, apenas enfatizar, a restrição imposta por Deus concernente
ao fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal. Se a intenção de Eva, ao
colocar palavras na boca de Deus foi mesmo a de enfatizar a restrição, isto
então, torna a opção feita pela mulher, no verso 6 adiante, apenas tanto mais
odiosa. Independente da intenção da mulher, o fato é que a serpente usou,
exatamente, este “aumento” no mandamento dado por Deus, para prosseguir com o
ataque iniciado no verso 1.
Versos
4 e 5: Então, a serpente disse à mulher: É certo que não morrereis. Porque Deus
sabe que no dia em que dele comerdes se vos abrirão os olhos e, como Deus,
sereis conhecedores do bem e do mal.
Como destacamos em Gênesis 3:1, a serpente iniciou seu
ataque com uma afirmação interrogativa de choque — na forma de incredulidade —
e de surpresa. E aqui reside outra tentação perene da raça humana: Tentação
# 3 = não crer naquilo que Deus diz.
Todavia, aqui, em Gênesis 3:4—5, a serpente não precisa
mais usar de expressões de “choque e de surpresa”. Uma vez que a isca havia
sido fortemente mordida pela mulher, a serpente se torna rigorosamente
dogmática ao afirmar: “É certo que não morrereis”. Estas últimas palavras da serpente representam:
1. Em primeiro lugar trata-se de um ataque frontal e
certeiro contra as palavras proferidas pelo próprio Deus em Gênesis
2:16—17, acerca do fruto da árvore do
conhecimento do bem e do mal.
16
E o SENHOR Deus lhe deu esta ordem: De toda árvore do jardim comerás
livremente,
17
mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia em
que dela comeres, certamente morrerás.
2. Em segundo lugar, as palavras da serpente negam, de
forma peremptória, qualquer possibilidade de que poderia haver qualquer verdade
na preocupação demonstrada pela mulher acerca da morte — independentemente de
como os primeiros seres humanos entendiam a expressão “morte”.
Visando solidificar seu caso contra Deus, a serpente
lança mão do próprio Deus. Esta é outra tentação perene da raça humana: Tentação
# 4 = usar Deus como desculpa para justificar-se. Como já vimos, a serpente iniciou seu ataque
dirigindo-se à palavra de Deus: “é assim que Deus disse — Gênesis 3:1”. Agora, neste segundo momento, o tentador procura
direcionar a atenção da mulher para o próprio Deus; para os próprios
pensamentos e intenções de Deus. A serpente deseja dar a impressão de que
conhece a Deus melhor do que a mulher poderia conhecê-lo a qualquer tempo. Suas
palavras, “É certo que não morrereis”, implicam que a serpente quer dar a entender que ela
pode penetrar a mente do Deus Eterno e saber exatamente aquilo que Deus sabe e
pensa. Existe sim, um ser que pode penetrar e saber até as coisas mais profundas
de Deus. Mas não é esse ser personificado na serpente. O único ser que pode e
efetivamente sabe, todas as coisas, até aquelas mais profundas escondidas em
Deus é o Espírito Santo —
1
Coríntios 2:10
Mas
Deus no-lo revelou pelo Espírito; porque o Espírito a todas as coisas
perscruta, até mesmo as profundezas de Deus.
Ato contínuo, a serpente prossegue afirmando, de forma
dogmática, que a desobediência, ao mandamento de Deus, não irá trazer a grave
consequência mencionada por Deus — a morte, independentemente de como Adão e
Eva entendiam qual era o significado dessa palavra. Pelo contrário, a
desobediência iria trazer algo positivo; seria uma verdadeira bênção na vida
dos dois humanos ali presentes. Ah! A ilusão causada pela tentação do pecado. O profeta Isaías, em outro contexto, registrou palavras
que expressam, de forma perfeita, as consequências do pecado ao dizer:
Profeta Isaías
Isaías
5:24
Pelo
que, como a língua de fogo consome o restolho, e a erva seca se desfaz pela
chama, assim será a sua raiz como podridão, e a sua flor se esvaecerá como pó;
porquanto rejeitaram a lei do SENHOR dos Exércitos e desprezaram a palavra do
Santo de Israel.
A desobediência aos mandamentos de Deus e o desprezo à
palavra do Senhor trazem sempre um mesmo resultado final: miséria absoluta.
Mas, no argumento da serpente, o consumo do fruto proibido, em flagrante
desobediência ao mandamento de Deus, resultará em terem, a mulher e o homem,
seus olhos abertos; fará também com que os dois se tornem conhecedores do bem e
do mal. Por fim, como uma espécie de coroa, a desobediência fará com que eles
sejam exatamente como Deus! Quanta mentira, quando engodo, quanta ilusão!
A nossa versão de Almeida Revista e Atualizada captura de
maneira magistral o predicativo do hebraico, ao dizer: “como
Deus, sereis conhecedores do bem e do mal”.
Aqui reside mais uma tentação perene dos seres humanos: Tentação
# 5: Ser como Deus. E esta é a tentação
suprema dos seres humanos.
A serpente mistura, de forma astuta e sagaz, palavras
que tanto negam a verdade divina, bem como palavras que acusam Deus de ser
parcial e desonesto. Esta mistura de palavras e
ideias visam despertar na mulher um desejo. E este desejo tem a ver com
a possibilidade da mulher se tornar em algo maior do que aquilo que ela
realmente é e, o que é pior, em algo maior do que Deus mesmo pretendia que ela
fosse. A tentação faz exatamente isto: abre o desejo que faz
vislumbrar a possibilidade de alcançarmos ou nos tornarmos em mais do que
aquilo para o que fomos criados. Os resultados são sempre
catastróficos. Essa é outras das nossas perenes tentações: Tentação
# 6: Desejar Ser mais do que nós somos, mais do que Deus deseja que sejamos.
Da perspectiva que a serpente sugere à mulher, a
narrativa de Gênesis 3 nos mostra que comer do fruto proibido é um erro que
acaba por produzir uma “vantagem”: para a serpente, comer do fruto proibido era
o equivalente a tornar-se alguém como o próprio Deus. Para alcançar o alvo que
é fruto do desejo despertado — ser como Deus — é necessário transgredir a uma ordem
direta do Criador! Essa é a impressão que a serpente deseja causar na mulher.
Mas, como o texto deixa bem claro, o ganho alcançado não passa, na realidade,
de uma grande desvantagem.
Gerhard Von Rad
O desejo já está instalado na mulher. Agora ela precisa
decidir o que fazer. Ela considera a possibilidade de ganho da seguinte
maneira: Caso eu tome e coma do fruto, seguindo a sugestão da serpente e contra
a ordem expressa de Deus, então eu estarei de fato desobedecendo a Deus, mas
estarei também iniciando minha ascensão em direção a tornar-me “como Deus”. Gerhard
Von Rad[2], teólogo alemão, diz no seu comentário do Gênesis, o
seguinte: “a insinuação da serpente é a de uma possibilidade
de extensão da existência humana que vai além dos limites estabelecidos por
Deus, na criação, um aumento da vida não somente no sentido de enriquecimento
intelectual bem como da familiaridade e poder sobre mistérios que estão além da
capacidade humana”. Temos aqui mais uma das
perenes tentações com as quais temos que lidar: Tentação # 7: O desejo de
conhecer as coisas ocultas que estão além da capacidade humana. Fazemos bem em ouvir as palavras de Moisés em
Deuteronômio
29:29
As
coisas encobertas pertencem ao SENHOR, nosso Deus, porém as reveladas nos
pertencem, a nós e a nossos filhos, para sempre, para que cumpramos todas as
palavras desta lei.
Os
desejos que produzem em nós a visualização das possibilidades daquilo que
podemos alcançar através da desobediência a Deus, não passam de fantasias. Entre essas fantasias, nenhuma é mais poderosa do que a
da deificação ou a idéia de que podemos ser exatamente como Deus mesmo! Para o
professor de Antigo Testamento do Asbury College no estado do Kentuky nos
Estados Unidos da América, Victor Hamilton, “a deificação é uma fantasia
difícil de reprimir e uma tentação difícil de rejeitar. No caso da mulher, tudo
o que ela precisa fazer para aceitar a fantasia e ceder à tentação é mudar sua
decisão de fazer a vontade de Deus para a decisão de fazer a própria vontade.
Todas as vezes que uma pessoa faz da sua própria vontade algo crucial e, da
vontade revelada de Deus algo irrelevante ou, sempre que a autonomia do
indivíduo desalojar a submissão e a obediência a Deus, o indivíduo finito
estará tentando ultrapassar os limites estabelecidos pelo Criador”[3].
Imperador Romano Otávio “Augusto”
Uma boa ilustração do que
acabamos de citar é a arrogância do rei da Babilônia como descrita em Isaías
14:3—24, especialmente o verso 14, onde lemos: “subirei acima das mais altas
nuvens e serei semelhante ao Altíssimo”. Por
semelhante modo, o imperador romano Otávio, agregou a si próprio o epíteto de
“AUGUSTO” que quer dizer: aquele que é digno de receber adoração. De fato, a
adoração ao imperador estava espalhada por todo o império romano e era, de
longe, o culto mais praticado pelos súditos imperiais. Esse culto ao imperador,
um mero homem mortal, era muitas vezes usado, como desculpa, para perseguir os
cristãos que se recusavam a prestar culto ao imperador. Os cristãos sabiam que
o imperador romano era apenas um mero homem, como qualquer outro, pelo simples
fato de que ele podia sangrar como qualquer outro ser humano.
Continua....
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http://ograndedialogo.blogspot.com.br/2017/02/genesis-estudo-045-tabua-das-nacoes.html
Que
Deus abençoe a todos.
Alexandros
Meimaridis
PS. Pedimos a todos os nossos leitores que puderem
que “curtam” nossa página no Facebook através do seguinte link:
Desde já agradecemos a todos.
[1] Bonhoeffer, Dietrich. Creation and Fall. Traduzido do alemão por J. C. Fletcher. SCM Press Limited, London, 1959.
[2] Rad, G. Von. Genesis. Revised Edition. Traduzido do
alemão por J. H. Marks. The Westminster Press, Philadelphia, 1972.
[3] Hamilton, Victor P. The Book of Gênesis – chapters 1 – 17 in The
New International Commentary on the Old Testament. William B. Eerdmans
Publishing Company, Grand Rapids, 1990.
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