O artigo abaixo foi publicado pela
revista Cristianismo Hoje e é da autoria de Tim Stafford.
Novo
nascimento espiritual
Cristianismo cresce entre as
classes menos favorecidas da Índia e já influencia outros setores da sociedade.
Escrito por Tim Stafford
Shivamma está descalça; seu sári
é simples e seu corpo, esquelético. Sua casa foi construída dentro de um tubo
de captação de água pluvial, descartado pela fábrica onde ela e o marido
trabalham. A vizinhança, escondida num enorme pátio arborizado, é composta por
canos imensos, perfilados como se fossem traillers. A família da Shivamma,
composta por quatro pessoas, vive na Índia. Apesar de ela ser oriunda da casta
dalit, sua vida melhorou depois que ela abraçou a fé cristã. Ela veio morar na
vila de tubos como uma jovem noiva, buscando escapar da miséria de sua vila
natal. Shivamma e seu marido ganham o equivalente a US$ 5 dólares (uns 11
reais) por dia. Por três anos, ela permaneceu estéril – até que um jovem
cristão, chamado Bangarraju, veio à sua casa orar por ela: “Eu não sabia porque
ele tinha vindo ou para quem ele orava”, lembra a mulher. “Pensei que Jesus
fosse um dos deuses”. Ela concebeu, dando à luz a um filho e, depois, a uma
segunda criança, uma menina. Quando sua filha tinha três meses de idade, ficou
muito doente. Bangarraju veio, orou novamente, e a garota foi curada. “Dei-me
conta de que Jesus era o Deus verdadeiro”, diz Shivamma. A conversão mudou a
rotina da pobre família. “Costumávamos beber e todos os dias tínhamos brigas
terríveis. Jesus Cristo trouxe paz à nossa casa. Não tenho mais medo porque
conheço o verdadeiro Deus e confio nele”, declara.
É provável que Shivamma não tenha
noção disso, mas pessoas como ela são a cara da nova Índia cristã. Potência emergente
e um dos principais pólos de atração de investimentos internacionais, o país,
de mais de 1 bilhão de habitantes, tem visto surgirem comunidades cristãs
vibrantes e crescentes. Elas são parte de uma Igreja totalmente nacional,
contextualizada com a cultura local e fruto de evangelismo autóctone. A
recém-criada Índia cristã é encontrada na camada mais baixa da sociedade, em
meio a homens e mulheres como Shivamma, pobres e analfabetos. Eles pensam de
uma forma inimaginável para seus ancestrais e muitos estão seguindo a Cristo,
fato inédito na história do país. Ser um dalit é muito pior do que ser pobre,
pois não importa quanta educação ou patrimônio acumule, o indivíduo permanece
impuro. Eles são cerca de 150 milhões de pessoas, e, como os leprosos bíblicos,
exceto pelo fato de que, conforme a cultura indiana dominante, não podem ser curados.
Contudo, muito embora descenda de gerações de pessoas acostumadas a se curvar e
a resignar-se com a invisibilidade social, Shivamma não se humilha mais.
Bangarraju também é um dalit. Missionário e fundador de igrejas, ele começou a alcançar a vila dos tubos em 1996. Ensinava crianças analfabetas numa escola informal, que se reunia debaixo de uma árvore. Além disso, o obreiro organizava visitas médicas, com o apoio da missão que o sustenta, a Operação Mobilização. Durante o seu primeiro ano de visitas à vila, Bangarraju nada disse sobre Jesus. Agora, uma grande parcela da vila de tubos segue a Cristo. Com o passar dos anos, o missionário fez mais do que pregar o Evangelho: ele ensinou Shivamma e seu marido a disciplina necessária para economizar dinheiro. Como resultado, o casal conseguiu comprar uma casa em sua vila natal. Considerando o futuro próximo, Shivamma está feliz morando em seu tubo, sem ter de pagar aluguel. Ainda assim, ela tem sonhos maiores para seus filhos: a educação que nem ela ou seu marido receberam. Por isso, está decidida a fazer com que as crianças aprendam inglês e saiam da vila de tubos. “Não queremos que eles sofram como nós sofremos”, resume.
OPORTUNIDADES
A igreja da Índia cresce de maneira vertiginosa. Hoje, cerca de 70 milhões de indianos declaram-se evangélicos, segundo dados da missão Operação Mundial. Tal número, se verdadeiro, a colocaria entre as oito maiores populações cristãs do mundo, logo atrás de Filipinas e Nigéria, e maior do que em nações de forte tradição protestante, como Alemanha ou Reino Unido. Só que, diferentemente dos irmãos de fé em outros países, os crentes da Índia vivem num contexto espiritual bem próprio e hostil – o panteão hindu tem quase 300 milhões de deuses e há grupos religiosos extremistas atuando no país. Quando fundamentalistas hindus venceram as eleições nacionais em 1998, trouxeram com eles um hinduísmo radical que fomentou perseguição aos cristãos e leis contrárias à conversão. O evangelismo público tornou-se praticamente impossível. Missionários indianos, então, deixaram as pregações e reuniões nas ruas, estabelecendo-se e em lugares específicos com o intuito de abrir escolas, oferecer desenvolvimento econômico e treinamento, bem como implantar igrejas domésticas. Dez anos depois, na região de Orissa, confrontos religiosos deixaram mais de mil cristãos mortos e aldeias inteiramente destruídas. Grupos radicais de orientação hinduísta, maoísta e muçulmana costumam perseguir as comunidades cristãs, muitas vezes com a complacência das autoridades.
Mesmo assim, oportunidades para
espalhar as boas novas do Evangelho parecem estar em todo lugar. Outra
organização missionária, a Operação Mundial contabiliza 2.223 grupos ainda não
evangelizados na Índia, cinco vezes mais do que na China, a segunda nação menos
alcançada do mundo. “Índia, Afeganistão e Paquistão formam a maior concentração
da humanidade não alcançada do mundo”, afirma Jason Mandryk, ligado à entidade.
Contudo, por toda a vasta nação, relatos sobre conversões a Cristo se sucedem.
A Operação Mobilização, uma das maiores agências missionárias que atuam no
país, cresceu a ponto de abranger 3 mil congregações, das quais trezentas
surgiram na última década. Certo ministério, com base em um hospital no norte
da Índia, testemunhou 8 mil batismos ao longo dos últimos cinco anos, após um
longo período de poucos resultados na pregação. As detalhadas estatísticas da
agência missionária mostram que a Igreja cristã está crescendo a uma taxa três
vezes maior do que a população hindu da Índia.
“Isso é algo novo nos últimos dez
anos, especialmente no norte da Índia”, avalia Todd Johnson, diretor do Centro
para o Estudo do Cristianismo Global do Seminário Teológico Gordon-Conwell. Ele
adota estatísticas mais modestas em relação à quantidade de cristãos no país. O
Atlas do Cristianismo Global, editado pelo centro, estima que eles seriam perto
de 60 milhões. A diferença, contudo, pode ser explicada pela metodologia de
contagem. É que muita gente está frequentando comunidades religiosas
independentes e outros, embora convertidos ao Evangelho, não revelam
abertamente sua condição, devido ao temor de represálias e supressão de
direitos familiares ou sociais. O censo
indiano de 2001 colocou os cristãos como representando um pouco mais do que 2%
da população do país. Contudo, atualmente a Operação Mundial estima esse número
próximo de 6%, e aponta que pesquisadores cristãos na Índia encontram
resultados ainda maiores, alcançando nove por cento. “Inúmeros cristãos
indianos dizem que portas fechadas por séculos estão se abrindo”, destaca
Johnson.
Em uma nação com território de
proporções continentais e habitada por centenas de grupos étnicos, é difícil
ter certeza sobre essas tendências. As estatísticas sobre religião são poucas,
e os relatórios de organizações missionárias podem refletir apenas condições
locais. Mesmo assim, a mudança no panorama religioso na índia é perceptível.
“Situações animadoras estão acontecendo. Isso é real”, comemora Johnson. “Nossa
metodologia é esperar para ver e fazer nosso melhor para identificar esse movimento.
Porém, o que está ocorrendo é notável. Todo mundo concorda com isso”. Mandryk
lembra que os resultados mais notáveis são observados justamente na base da
pirâmide social. “Todos sabem sobre o incrível reavivamento entre os dalits.
Esse foi o maior crescimento nos últimos anos”, comenta. Contudo, a influência
já se faz sentir em outros setores da sociedade. “Agora, vemos sinais de crescimento entre as
castas médias e entre aquelas pessoas com menos de 35 anos. Existe uma nova
dinâmica em curso entre a geração urbana e educada, e também nas castas mais
altas.”
Embora as taxas de crescimento da
Igreja não tenham atingido o mesmo nível daquelas observadas na China, durante
o pico das décadas de 1970 e 80, Mandryk acredita que ele pode ser acelerado. “Está ocorrendo uma mudança de marcha e o
movimento começa a ganhar velocidade. A diversidade de castas, regiões e
contextos é um fator importante. O crescimento da igreja não está mais restrito
aos miseráveis.”
“MENSAGEM DE
LIBERTAÇÃO”
Inquestionavelmente, a Índia está no meio de rápidas mudanças econômicas e sociais. Essas mudanças contribuem para quebrar tradições religiosas, especialmente o sistema indiano de castas. “O hinduísmo é uma ferramenta para nos oprimir”, diz T.V. Joy, um plantador de igrejas no norte da Índia: “E o Evangelho é uma mensagem de libertação, não apenas para o céu. Ele tem palavras de liberdade. A verdade é que Deus fez o homem à sua imagem”. Essa verdade, afirma Joy, enfraquece as concepções tradicionais sobre as castas. Entre 70% e 90% dos cristãos na Índia são dalits. Quando se convertem, eles reforçam a imagem do cristianismo como uma religião digna de desprezo por parte dos demais grupos – como os brâmanes, a elite religiosa, e os militares, proprietários rurais e trabalhadores, que ocupam as outras castas. Embora o governo, oficialmente, tenha suprimido esse sistema social, a discriminação também existe entre os cristãos. “Na teoria, sermos todos um em Cristo está correto, porém na prática isso não é verdade”, atesta diz Y. Moses, uma ativista dalit.
A maioria dos cristãos indianos
afirma que suas igrejas enfrentam grandes desafios. Materialismo, discriminação, disputas entre
as lideranças e uma fé desinteressada são males evidentes. Porém, quando
instados sobre a razão de os indianos estarem indo a Cristo em números
impressionantes, líderes apontam o trabalho do Espírito Santo. Então, eles
mencionam fatores críticos que enfraquecem crenças hindus tradicionais,
deixando os indianos mais abertos à mudanças. Um deles é o crescimento urbano.
Na Índia, 43 cidades têm mais de um milhão de habitantes, e grandes aglomerados
como Calcutá, Mumbai e Nova Déli, passam de dez milhões. As cidades apresentam
grande fluidez social – pessoas de todas as classes se misturam e as castas se
tornam menos importantes. O preconceito permanece, porém é mais sutil, e assim
pessoas menos favorecidas podem ascender socialmente.
Outro aspecto favorável é a
ênfase cristã na educação. Agências missionárias têm montado projetos de
formação profissional, ensino médio e de inglês, inclusive nas vilas rurais. O
setor de serviços também está crescendo rapidamente. Um pastor cristão no norte
da Índia, por exemplo, forma técnicos em manutenção de aparelhos de
ar-condicionado. E os formados, praticamente todos oriundos das castas mais
baixas, conseguem empregos nas novas empresas, mais interessadas na eficiência
do que na origem social dos funcionários. “Os missionários democratizaram a
educação”, diz o advogado dalit A. Maria. De fato, muitas das melhores escolas da
Índia são instituições cristãs privadas fundadas por missionários, algumas
remanescentes do período colonial britânico. Como era de se esperar, estudantes
abastados (e, consequentemente, de castas mais prestigiadas) procuram essas
escolas, tendo contato com outro tipo de abordagem religiosa.
A consolidação da democracia, por
outro lado, também mostra a crescente influência cristã. O pleito parlamentar
de 2009 registrou um recorde de 60% de comparecimento às urnas entre os mais de
700 milhões de eleitores. Algumas regiões cristãs testemunharam uma enorme
frequência. Por exemplo, Nagaland, no nordeste da Índia, que concentra uma alta
taxa de cristãos, registrou um recorde de 90% de comparecimento. O ingresso de
obreiros no país também está mais fácil. A Índia havia parado de conceder
vistos a missionários vindos do exterior nos anos 1950. Isso aniquilou escolas
e hospitais cristãos, que dependiam de capacitação estrangeira. Contudo,
gradualmente, o número de agências missionárias indianas tem crescido. Em 1971,
havia menos de 20 delas; hoje existem, no mínimo, duzentas. A Operação Mundial
conta com mais de 80 mil missionários indianos, a maioria servindo em um
ambiente transcultural.
“Deus nos chamou para plantar
igrejas”, diz Alfy Franks, da Operação Mobilização. No entanto, a instalação de
novas congregações cristãs, em geral, é combinada com outras atividades, como
fornecimento de microcrédito, educação e assistência médica. Na Índia, a
veneração a uma infinidade de deuses e o ambiente favorece o misticismo –
portanto, uma abordagem puramente espiritual não passa necessariamente a
mensagem certa. Por meio do desenvolvimento comunitário, os missionários
indianos demonstram que Jesus é mais do que apenas mais um deus a ser adorado.
Ele é o Senhor que transforma vidas. Para os indianos que sofrem com a opressão
espiritual ou com a pobreza – sem dúvida, indianos de todas as castas –, essa
mensagem de transformação fala poderosamente.
O artigo original da Cristianismo
Hoje poderá ser visto por meio desse link aqui:
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Que Deus abençoe a todos.
Alexandros Meimaridis
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