O artigo abaixo foi publicado
pelo site da Revista ISTOÉ é eé de autoria de João Loes e Rodrigo Cardoso.
A
rotina dos popstars da fé
Divididos entre religião e
carreira, família e viagens, missas e shows, esses campeões de vendas se
desdobram para equilibrar o divino e o mundano no dia a dia
Por João Loes e Rodrigo Cardoso
Eles detestam ser chamados de
estrelas. Repetem, insistentemente, que são, na melhor das hipóteses, um mero
canal para a graça de Deus. A humildade do discurso, porém, contrasta com a
postura de celebridade desses ídolos cristãos e com os números que compõem este
que já é o mais expressivo segmento do mercado fonográfico do País. Estima-se
que, só em 2011, a produção de discos e DVDs religiosos no Brasil rendeu R$ 1,5
bilhão. Como não poderia deixar de ser, no mesmo ano, os discos e os DVDs mais
vendidos, segundo a Associação Brasileira dos Produtores de Discos (Abpd),
foram dos astros da fé padre Marcelo Rossi e padre Fábio de Melo,
respectivamente.
AMIGOS - Padre Marcelo e padre Fábio na gravação do DVD “Ágape”, em São Paulo
O domínio não é só católico.
Estrelas do mundo gospel têm tido cada vez mais espaço para brilhar. Pudera,
hoje o Brasil tem pelo menos 42 milhões de evangélicos, segundo dados do Centro
de Pesquisas Sociais da Fundação Getulio Vargas (CPS/FGV). Nomes como Aline Barros,
Ana Paula Valadão e Regis Danese são verdadeiras potências capazes de arrastar
centenas de milhares de pessoas a shows, cruzar barreiras religiosas e vender
milhões de discos e DVDs. “E tem uma outra coisa – para os evangélicos,
pirataria é roubo e roubo é pecado”, afirma o evangélico Danese. Como
consequência, as perdas para a pirataria de gravadoras especializadas nesse
mercado não passam de 15% do faturamento, enquanto para as outras o percentual
pode chegar a até 60%.
Mas como vivem essas pessoas,
divididas entre a pureza da mensagem divina e a lógica violenta do mercado?
Como administram fé, carreira artística, vida religiosa, família, viagens, fãs,
sucesso e dinheiro? ISTOÉ ouviu cinco dos mais importantes representantes do
gênero na atualidade, além de gente do seu círculo social, para a seguir
mostrar as alegrias, tristezas, paixões e dúvidas dos astros da fé.
"Gosto de roça, de bicho. Em
casa tenho pouquíssimos ruídos" Padre Fábio de Melo
Um mês atrás, padre Fábio de Melo
desabafou em seu Twitter que, cansado da cidade grande, qualquer dia venderia
seu iPhone e compraria um casal de gansos. Aos 42 anos, o sacerdote que nasceu
em Formiga, interior de Minas Gerais, e atravessou fronteiras graças aos cerca
de 30 produtos que lançou no mercado – entre CDs, DVDs e livros –, mora sozinho
em um sítio numa região rural de Taubaté, interior de São Paulo. É lá, ao lado
dos dois cachorros, o mastiff inglês Nathan e o bulldog francês Lucca, que ele
relaxa. “Gosto de roça, de bicho. Em casa tenho pouquíssimos ruídos urbanos por
perto”, afirma o sexto maior vendedor de CDs do Brasil no ano passado. No
momento, o sacerdote cantor que já vendeu dois milhões de CDs e 700 mil DVDs
afirma: “Estou cada vez menos urbano.”
Apesar do discurso desapegado, padre
Fábio ainda não se livrou de seu smartphone. Também não abre mão de dirigir o
próprio carro na ida ao supermercado. Até já arriscou uma volta em um modelo
stock car, como mostra a foto acima, em 2010, um desejo antigo. Mas cavalgar,
cuidar pessoalmente dos cachorros e ajudar na limpeza da casa e do jardim são
seus principais passatempos quando encontra uma folga na agenda tomada – entre
celebrações e um programa de rádio – por 100 shows anuais e pelo menos um
lançamento de CD ou DVD por ano. “Com essa rotina, ficar em casa é sempre um
luxo”, diz o sacerdote. Vestindo batina, o caçula de oito filhos explodiu como
um fenômeno da música gospel no início dos anos 2000. “A vocação espiritual do
Fábio era a de um padre, mas a vocação natural era a de um artista. Sendo
assim, que se tornasse um padre artista”, afirma o padre João Carlos Almeida,
diretor da Faculdade Dehoniana e formador espiritual, musical e universitário
do sacerdote mineiro.
Padre Fábio aprendeu direitinho
com seu mentor. A timidez e a melancolia do início da carreira saíram de cena e
o mineiro boa-pinta de olhar triste conquistou o público se valendo de uma
linguagem comum ao ambiente acadêmico – própria de quem se formou em teologia e
filosofia, fez pós-graduação e lecionou em faculdades. “Fábio não é padre que
faz sermão em igreja. Em qualquer lugar que ele vá seu discurso é estudado”,
afirma padre Almeida. “Ele é um poeta do evangelho”, diz o pré-candidato a
prefeito de São Paulo Gabriel Chalita, que publicou dois livros em parceria com
o amigo religioso. Um poeta que, além da articulação das palavras, zela pela
aparência. Ela, afinal, também tem o dom de cativar fãs fiéis. “Vou
regularmente ao dermatologista. Já tive câncer de pele e uma paralisia facial
na juventude. E procuro controlar o peso”, afirma ele. “Eu me cuido, sim. Estar
bem-vestido faz parte do meu trabalho. É uma hipocrisia achar que o padre
precisa andar mal-arrumado e desleixado.”
"Trocaria meu corpo por três
de 18 anos" Padre Marcelo Rossi
Padre Marcelo Rossi, 45 anos,
estava pronto. Na tarde do domingo 20, de batina branca, ele rumou para a
cripta que fica embaixo do enorme palco do Santuário Theotókos Mãe de Deus, em
construção há oito anos. Ali, seu corpo repousará em sono eterno quando sua
missão na terra acabar. O momento era de oração. Todos estavam em corrente
vibrando para que a gravação do DVD “Ágape”, que começaria alguns lances de
escada acima e dali a pouco mais de uma hora, se tudo corresse bem. “Dava pra
sentir a energia no ar”, diz um membro da equipe musical. E que energia! Uma
multidão de 45 mil fiéis já se aglomerava diante do palco do santuário para
acompanhar a gravação e se fazia ouvir, através do concreto da cripta, com
poderosos gritos de Jesus.
Seria ingênuo pensar que padre Marcelo
já se acostumou com eventos como esse. E, mesmo que tivesse se acostumado, este
certamente teria sabor diferente. O DVD “Ágape” é um desdobramento do sucesso
inédito e retumbante do religioso no mercado editorial com o livro de mesmo
nome lançado em 2010, que já vendeu oito milhões de cópias. “Minha vida está
uma loucura, uma correria, mas uma bênção”, diz ele. Até agosto, de segunda a
quarta, sua agenda está tomada por sessões de autógrafo em 12 cidades
brasileiras. Em meio a esse estresse, ele faz o que pode para manter a rotina.
Acorda sempre entre as três e quatro da manhã, faz uma breve oração, não toma
café e mergulha nos afazeres diários, que incluem uma entrada ao vivo em rádio,
obrigações com a obra no santuário e cuidados com a saúde. “Procuro fazer
esteira e fisioterapia quatro vezes por semana”, diz.
Em 2010, depois que sofreu um
grave acidente na mesma esteira que usa hoje, padre Marcelo chegou a celebrar
missas em cadeira de rodas. A queda lhe rendeu um pé quebrado, tendões rompidos
e um insistente problema no joelho que ainda teimam em incomodá-lo. Para
amenizar as dores, o religioso tem alternado quatro pares de tênis do tipo
esportivo, desenhado para amortecer impactos. Membros da equipe de filmagem da
Rede Vida, que transmite suas missas há anos, e voluntários mais antigos que
trabalham organizando a multidão nas celebrações em São Paulo dão como certa a
ingestão de remédios pelo padre, tanto para dor quanto para inflamação. Isso
poderia explicar, em parte, a dificuldade que ele tem tido em se mexer com
agilidade e o visível inchaço de seu rosto. “Só com muita fé para fazer o que
ele faz com as dores que deve sentir”, disse uma pessoa próxima, que revelou
ainda que o popstar católico não pisa num supermercado, restaurante ou cinema
há anos. “Não tem jeito, junta uma multidão pra ver, tocar, tirar foto e pedir
bênção.”
Sobre o fervor dos fiéis, Marcelo
lembra de uma história divertida. “Uma vez, uma senhora me viu dirigindo e
começou a me fechar até que eu tive que subir, literalmente, na calçada e parar
o carro”, diz ele. “Ela desceu, se ajoelhou e pediu uma bênção”, conta. Desde
então ele não dirige mais e conta com o fiel Chicão, motorista e faz-tudo, para
ajudá-lo a se deslocar. Quando questionado sobre o que espera do futuro, dá sinais
de que o cansaço físico já começou a pesar. “Nos próximos cinco anos me vejo
com mais experiência”, diz. “Mas trocaria meu corpo por três de 18 anos.”
"Acompanho o dever de casa do Nicolas, o levo para a escola, alimento e dou banho na Maria Catherine" Pastora Aline Brarros
Nicolas sobe as escadas de casa
chorando. No andar de cima, sua mãe, a pastora, cantora e escritora Aline
Barros, interrompe a conversa telefônica para acalmar o primogênito de 8 anos,
que está usando aparelho nos dentes. “Deixa a mamãe ver. Onde está doendo?”,
diz. Aos 35 anos, a maior expoente feminina da música gospel brasileira tem
hoje os filhos mais perto de si do que os microfones com os quais se tornou
fenômeno da indústria fonográfica. Sete meses atrás, Aline deu à luz Maria
Catherine e, desde então, a maternidade sobrepujou a sua rotina artística. Foi
só em março, após seis meses dedicados exclusivamente à filha, que a cantora
retomou os compromissos no show biz. “Minhas manhãs ainda são para os meus
filhos. Acompanho o dever de casa do Nicolas, o levo para a escola, alimento e
dou banho na Maria Catherine”, diz a pastora da Igreja Comunidade Evangélica
Internacional da Zona Sul, no Rio de Janeiro, frequentada por ela toda quarta e
domingo.
Desde 1995, quando lançou o
primeiro de 27 álbuns, a evangélica já vendeu cerca de seis milhões de cópias e
ganhou quatro Grammys latinos (o último no ano passado). Aline foi a primeira
cantora gospel do País a conquistar um Grammy, em 2004. A gravação do álbum
premiado, “Fruto de Amor”, foi cercada de muita tensão. Na época, um problema
nas cordas vocais provocava rouquidão na pastora e só lhe permitia gravar
depois de uma longa pausa de recuperação. “Procurei uma fonoaudióloga, que me
disse que eu estava com apenas 5% da voz em perfeitas condições”, lembra.
Com a voz recuperada, a pastora
iria cantar para cerca de dez mil pessoas no Maracanãzinho, no Rio de Janeiro.
Onipresente em programas de tevê fora do segmento cristão e amparada por
números de uma estrela, com músicas gravadas em espanhol, a carioca que cresceu
no subúrbio da Vila da Penha e hoje vive no confortável bairro da Barra da
Tijuca não se veste com o manto comum às celebridades. “Se deixar, a Aline
passa o dia de jeans e tênis”, revela a sua mãe, Sandra Barros. “Ela é
despojadona.” De fato, a pastora cantora já esteve em três programas de tevê
diferentes, em uma mesma semana, calçando o mesmo sapato.
A evangélica se policia para não
fazer a vida girar em torno da carreira. Seu marido, o ex-jogador de futebol
Gilmar dos Santos, com quem está há 12 anos, revela um pacto feito pelo casal.
“Desde que nos casamos, acertamos que não permitiríamos que a nossa vida
ficasse refém de uma agenda.” Hoje, quando tem de viajar de avião para alguns
dos 110 shows que faz por ano, ela carrega a filha no colo e procura embarcar
em voos próximos ao horário dos shows. Inspirada pela fase materna, Aline
planeja montar uma loja de roupas infantis. “Eu visto a Maria Catherine três
vezes por dia, só para ficar namorando suas roupinhas”, diz.
"Hoje, meu foco é minha
filha" Regis Danese
A rotina de shows já foi mais
puxada para Regis Danese, nascido João Geraldo Danese Silveira em 2 de abril de
1972, na cidade de Passos, interior de Minas Gerais. Até 2010, quando vivia o
auge do sucesso da música “Faz um Milagre em Mim”, que o consagrou no mercado
gospel, o pacato mineiro se desdobrava para cumprir uma agenda de shows que
chegava a ter 40 apresentações em um mês. A música, de 2008, é tida pela
indústria fonográfica evangélica como a responsável por romper importantes
barreiras. Foi das primeiras a ser tocada livremente em rádios FM laicas, a ser
gravada por padres católicos e a ganhar dezenas de versões. Foram 50 mil discos
vendidos no primeiro mês de lançamento e um milhão em menos de um ano. “Graças
a ela, fazíamos três shows em uma noite só”, diz Danese, que vive em Belo
Horizonte.
Hoje, o ritmo de shows diminuiu,
mas ainda está longe de ser tranquilo. São cerca de oito apresentações por mês.
E, onde quer que esteja, Danese, como bom evangélico, está sempre com sua
“Bíblia” – a mesma, aliás, desde sua conversão, em 2000. Durante os voos para
os locais de show, muitas vezes em pequenos aviões particulares, ela é lida com
mais fervor. O artista admite que tem um medo saudável do aparelho. “Uma vez
pegamos uma tempestade em um aviãozinho de duas hélices que chacoalhava tanto
que nem a Bíblia eu consegui ler, então comecei a cantar”, lembra ele.
A voz, instrumento de trabalho e
de fé, é cuidada com esmero. Só não recebe mais atenção que o cabelo, sempre
espetado. São pelo menos 30 minutos de preparo, com sprays e produtos para
garantir o efeito conhecido pelos fãs. “Às vezes, quando não tem cabeleireiro,
eu ajudo, mas não fica lá essas coisas”, brinca Evander Domingues, o Vandinho,
violonista da banda de Danese e amigo dos tempos em que ambos ainda eram
membros do grupo de pagode Só Pra Contrariar.
É de Vandinho, da fé inabalável e
da família que Regis tem tirado forças para encarar o mais recente desafio que
a vida lhe jogou: a leucemia da filha mais nova, Brenda, 3 anos. Em viagem para
a Disney, nos Estados Unidos, no mês de janeiro, a menina começou a passar mal,
estava anêmica, muito branca e cheia de manchas roxas pelo corpo. Em visita a
um hospital de Orlando, foi internada imediatamente e teve de receber uma
transfusão de emergência. “Ela estava praticamente sem sangue”, diz Kelly Danese,
mulher de Regis. Hoje, o tratamento quimioterápico pelo qual a menina passa em
Belo Horizonte mudou a rotina da família.
O astro gospel já não joga mais
seu futebolzinho semanal e pouco se diverte. “Todo o tempo livre que ele tem
passa em casa olhando para a Brenda e orando”, diz Kelly. Um DVD, que seria
gravado no mês que vem pelo astro, foi cancelado. Os shows, porém, continuam.
Quando está fora, ele liga mais de cinco vezes por dia para saber notícias.
“Hoje, meu foco é minha filha”, diz Danese.
"Nem o sucesso da missão
justifica o fracasso da família" Ana Paula Valadão
“Vai com Deus, porque quando você
cantar o ladrão não vai mais ser ladrão.” A frase dita pelo precoce Isaque
Valadão, 6 anos, é o que move Ana Paula Valadão, mãe do garoto e vocalista da
banda Diante do Trono, um fenômeno da música gospel que existe há mais de 15
anos e já vendeu mais de dez milhões de discos. Quando as obrigações da
carreira musical atropelam a rotina dessa mineira de Belo Horizonte, é na frase
de Isaque que ela pensa. “É a garantia que tenho de que estou no caminho que
Deus quer pra mim”, diz Ana, 36 anos, integrante, ao lado da família, da Igreja
Batista da Lagoinha. “Ela encara a carreira e os sacrifícios exigidos como
missão divina”, diz a irmã, Mariana Valadão. E espera seriedade, compromisso e
abdicação semelhantes de todos de sua equipe. Atualmente, por exemplo, os 16
membros do Diante do Trono estão no que ela chama de “jejum de delícias” em
preparo para a gravação do 15o disco da banda. Durante os 40 dias que antecedem
a apresentação, cada um deve cortar do cardápio três ou quatro alimentos que
come por puro prazer. “O rigor é tanto que ela chega a proibir, nos hotéis, que
a equipe assista à televisão ou use a piscina antes de fazer uma apresentação”,
diz o irmão, André Valadão, outra estrela do mundo gospel.
FERVOR - Dezenas de milhares de pessoas
acompanham as celebrações de padre Marcelo
Comunicar-se com familiares,
porém, está liberado. Ela está sempre em contato com os dois filhos e o marido
pelo iPhone. Usando um aplicativo que permite a troca gratuita de mensagens de
texto e imagens, manda e recebe notícias constantes. Na última viagem, por
exemplo, o companheiro mandou fotos de Isaque e do irmão, Benjamin, 3 anos,
depois do banho, vestidos com o uniforme da escola e na hora de dormir,
aconchegados no canto dela da cama de casal. Já ela fotografou o quarto do
hotel e a roupa que escolheu para se apresentar. “Para eles verem como a mamãe
está”, diz ela. Quando volta, ela lê e assina todos os recados mandados pelas
professoras sobre seus meninos e faz questão de levá-los ao colégio sempre que
está em Belo Horizonte. “Nem o sucesso da missão justifica o fracasso da
família”, afirma.
Paciente com os fãs, Ana Paula
encara a rotina de autógrafos, fotos e conversas como parte de sua missão.
“Gosto da troca com eles”, afirma. A coisa só complica quando invadem seu
espaço. Certa vez, enquanto estava hospedada em um hotel-fazenda de férias, um
dos camareiros a acordou de um preguiçoso sono da tarde em seu quarto, enquanto
os filhos e o marido estavam na piscina. Ele queria tirar uma foto. “Achei um
pouco demais”, diz ela, rindo. No fim a foto foi tirada e o rapaz ainda
reclamou da imagem. Faz parte.
Íntegra da entrevista
com o Padre Fábio de Melo
ISTOÉ – Como a música passou a fazer parte da vida do senhor? Em quais
ocasiões, seja na infância, adolescência, ou mesmo agora, surpreende-se
cantarolando?
Padre Fábio de Melo – Já nasci com trilha sonora. Enquanto eu vinha
ao mundo, o médico cantava “Jesus Cristo”, canção de Roberto e Erasmo. Minha
mãe conta essa história para justificar o meu gosto pela música, mas também
para ressaltar a minha opção pelas questões religiosas. Eu sempre tenho uma
música na cabeça, ainda que não a cante. É um movimento natural que me leva ao
centro da vida. A música é o meio de transporte por onde eu chego aos
sentimentos do mundo.
ISTOÉ – Qual é o ritual do senhor antes de alguma apresentação?
Fábio de Melo – Não considero um ritual. Apenas gosto de ficar um
tempo, ainda que breve, em silêncio antes de começar. Geralmente faço um
aquecimento vocal antes do show, abençôo o palco e só.
ISTOÉ – A equipe de músicos viaja com o senhor no mesmo ônibus ou
avião, para apresentações que necessitam de viagens?
Fábio de Melo – A equipe é grande. Saímos de diversos lugares do
Brasil. Nem sempre vamos nos mesmos vôos, mas vez em quando a gente embarca no
mesmo ônibus. São as melhores viagens. É o momento da convivência.
ISTOÉ – Aos músicos é indicado algum tipo de conduta, durante as
viagens, ou nos dias que antecedem uma apresentação? Quantas pessoas fazem
parte do staff musical do senhor?
Fábio de Melo – Uma conduta? Que sejam bons pais, bons maridos,
bons amigos. A retidão de caráter é o resultado mais aprimorado que podemos
esperar da religião. Eu tenho a graça de estar rodeado de gente assim. A
unidade que experimentamos no palco é um desdobramento natural da vida que
vivemos fora dele. Viajamos em 16 pessoas.
ISTOÉ – Como o senhor compõe? Com violão, sentado em um sofá de
casa, na sala...? Há uma frequência?
Fábio de Melo – Eu componho toda vez que a criatividade se hospeda
em mim. Nem sempre ela vem. Mas também não corro atrás. Aprendi que inspiração
é bicho sem doma, não se deixa aprisionar. Mas quando ela me visita, não me
faço de rogado. Paro de fazer o que estou fazendo e cuido do que ela me trouxe.
Os lugares são inusitados. Ela não tem lugar para acontecer. Componho e escrevo
muito durante os deslocamentos.
ISTOÉ – O sr. ensaia com a banda com que freqüência? Faz exercício
para as pregas vocais?
Fábio de Melo – Só ensaio quando temos um projeto novo, como quando
fizemos o show com o Milton Nascimento, ou quando temos uma música nova no
repertório. O dia a dia da estrada nós já conhecemos bem. Eu não faço exercício
para a voz. Só procuro usá-la corretamente.
ISTOÉ – O senhor e/ou a gravadora possuem metas, como lançar um CD
por ano ou DVD por ano?
Fábio de Melo
– Geralmente é um produto por ano.
ISTOÉ – Quantas missas o senhor celebra por semana e, geralmente,
onde elas ocorrem?
Fábio de Melo – Procuro celebrar todo dia, mas nem sempre consigo.
Como tenho muitas viagens, celebro sempre onde estou. Tenho uma capela na minha
casa. Isso facilita muito.
ISTOÉ – O dia do senhor começa e termina que horas? O senhor tem
sono tranquilo?
Fábio de Melo – Acordo cedo, mesmo que tenha ido dormir muito
tarde. Meu sono é tranquilo. Se posso, durmo por volta de 23hs. Sonho mais
acordado que dormindo.
ISTOÉ – Detalhe, por favor, o dia a dia do senhor em uma semana.
Fábio de Melo – Por conta das muitas viagens, quase não tenho
rotina, mas gosto de levar minha rotina para onde estou. Quando estou em casa,
acordo por volta de 7hs, faço minha oração e vou ver as notícias. Depois tomo
café, respondo emails e vou trabalhar. Na parte da manhã eu me dedico aos
estudos. Fiz faculdades de Filosofia e Teologia. Gosto de me atualizar. Alterno
os temas. Almoço por volta de 13hs e depois vou fazer o que faz todo cidadão.
Pagar contas, mercado, médico, dentista, cuidar dos cachorros, tudo depende da
necessidade do dia. À tarde faço alguma atividade física (aeróbico ou
musculação). Tomo banho e volto a estudar. Depois janto, celebro missa, vejo
mais notícias, leio e vou dormir. A leitura é a última coisa que sempre faço.
ISTOÉ – O senhor segue alguma dieta? Como são balanceadas as
refeições do senhor? Faz exercícios com que frequência?
Fábio de Melo – Sou bastante disciplinado com a alimentação e a
atividade física. Tenho consciência de que o cuidado com o corpo é também regra
religiosa, pois através dele eu me disciplino para a conquista de virtudes
espirituais. Cuidar da saúde é uma responsabilidade que não negligencio. Sempre
arrumo um jeito de fazer uma atividade física, ainda que seja só uma caminhada.
ISTOÉ –
Quando começa o processo para escrever um livro, o que muda em sua rotina? Em
quais momentos o senhor rende mais para escrever? Escreve todos os dias? Por
quantas horas? O senhor conta com o auxílio de alguém para a confecção de seus
livros, alguém com quem troque idéias?
Fábio de Melo – Quando estou escrevendo fico bastante absorvido
pelo texto. Escrevo e reescrevo inúmeras vezes. Não gosto de produzir com prazo
estabelecido. A literatura tem ritmo próprio. Obedece ao movimento das
palavras. Meu fazer literário é muito solitário, mas sempre nasce da vida que
vivi ou que vi ser vivida ao meu lado. Minhas melhores ideias nascem da
observação que faço do mundo. Só partilho o que realmente estou seguro de que
vale a pena ser levado adiante. É aí que procuro os amigos para mostrar, trocar
ideias.
ISTOÉ – Em quais momentos o senhor costuma ler a Bíblia? O senhor a
lê todos os dias, impreterivelmente?
Fábio de Melo – Há duas formas de ler a Bíblia. Como estudo,
respeitando métodos hermenêuticos, e como fonte de espiritualidade. A leitura
estudiosa eu não faço todo dia. Já a leitura espiritual, esta faço diariamente.
A vida oracional de um padre é toda ela baseada em textos bíblicos. A vida
litúrgica nos favorece este contato com a Sagrada Escritura. É a oportunidade
que tenho de estar em comunhão com toda a Igreja presente no mundo inteiro. O
evangelho que proclamo, na missa que celebro em minha casa, é o mesmo que está
sendo proclamado no Japão.
ISTOÉ – Lê a Bíblia pelo celular? O que pensa desse recurso?
Fábio de Melo – Já me utilizei para localizar uma passagem. É muito
eficaz. Mas no dia a dia eu prefiro o livro mesmo.
ISTOÉ – Qual o ritual que o faz relaxar quando chega em casa depois
de um dia de compromissos?
Fábio de Melo – Eu não bebo.
Gosto de roça, bichos. É o que encontro quando chego em casa. Tenho
pouquíssimos ruídos urbanos por perto. É assim que descanso. Cuidando e sendo
cuidado a partir de uma simplicidade que me reporta aos tempos da minha
infância. Estou cada vez menos urbano.
ISTOÉ – O senhor dirige, costuma ir ao banco, padaria, pegar fila
em supermercado para pagar compras?
Fábio de Melo – Dirijo, vou ao mercado fazer compras. Gosto desta
rotina. O que acontece sempre é que entre um afazer e outro sou abordado por
alguém que se identifica com o trabalho que realizo. É o carinho das pessoas.
Faço questão de cuidar bem de cada um que se aproxima.
ISTOÉ – Costuma visitar seus parentes ou reuni-los em sua casa?
Fábio de Melo – Minha família está esparramada pelo Brasil. Somos
muitos. Eu os encontro mais durante os eventos. Meu contato maior é com minha
mãe. Vez em quando ela passa um tempo na minha casa.
ISTOÉ – O senhor gosta de sair para jantar? Costuma fazer programas
com amigos e amigas, como sair para ver filmes, exposições, correr em parques?
Fábio de Melo – Quase não saio. Sou caseiro por natureza. Gosto
muito de teatro e música. Quando posso, vou ver alguma coisa. Nos meus dias de
folga, gosto de andar a cavalo, cuidar pessoalmente dos meus cachorros, ajudar
na limpeza da casa, do jardim. Para quem viaja muito, ficar em casa é sempre um
luxo.
ISTOÉ – Até onde o senhor enxerga que vai a sua vaidade? Como o
senhor procura cuidar da sua aparência? Usa cremes, protetor solar, tem
predileção por um figurino ou sapato específico?
Fábio de Melo – Minha mãe fala que desde pequeno eu já escolhia o
que iria vestir. Eu me cuido, sim. Vou regularmente ao dermatologista, pois já
tive uma paralisia facial e câncer de pele, uso protetor solar e procuro
controlar o peso. Meu figurino é sempre o mesmo. Estar bem vestido faz parte de
meu trabalho. Sou um comunicador. Acho uma hipocrisia achar que o padre precisa
andar mal arrumado, desleixado. Só que isso não é tudo. O que verdadeiramente
conta é a elegância com que devo tratar as pessoas. Zelo muito para que todos,
independente da vida que levam, se sintam respeitados por mim. Eu não sou
melhor que ninguém. Apenas tenho uma missão que me diferencia.
ISTOÉ – Padre, poderia relatar um episódio que viveu recentemente
ao lado de um fiel que o emocionou?
Fábio de Melo – Certa vez, esperando as malas na esteira do
aeroporto de Guarulhos, encontrei uma senhora. Ela se aproximou e me disse,
mais ou menos assim: “Padre Fábio, há dois anos atrás, eu havia programado o
meu suicídio. Estava tudo pronto. Programei os mínimos detalhes. Na manhã
escolhida, peguei o meu carro e me dirigia ao sítio onde eu daria fim à minha
vida. Durante o trajeto, liguei o rádio e comecei a procurar alguma coisa pra
ouvir. De repente, caiu numa estação onde alguém falava sobre a urgência que
todo mundo tem de livrar-se dos fardos do passado. Era o senhor falando.
Comecei a ouvir aquela pregação e senti que Deus falava comigo. Fui sendo
envolvida a ponto de precisar parar o carro. Chorei muito. Senti que aquelas
lágrimas me purificaram de tudo o que me oprimia. Decidi jogar fora os pesos do
passado e resolvi me dar uma chance. Deu certo. Obrigado por ter me devolvido a
vida.”
ISTOÉ – O
senhor é uma pessoa que chora com frequência? O que o faz chorar? Lembra-se da
última vez que chorou?
Fábio de Melo
– Eu choro sempre. Não consigo me distinguir das dores do mundo. Minha alma não
tem cercas.
ISTOÉ – O senhor possui alguma mania ou coleciona algum objeto?
Fábio de Melo
– Manias? Acho que não tenho. Coleciono camisas de futebol, tenho cerca de
trinta. Torço para o Cruzeiro.
ISTOÉ – Como o senhor se vê daqui a 5 anos?
Fábio de Melo
– Feliz. Por estar mais próximo da aposentadoria. Eu não vejo a hora de
adquirir os direitos dos idosos (risos).
Íntegra da entrevista
com o Padre Marcelo Rossi
ISTOÉ - Com
gravação de DVD, sessões de autógrafo e viagens, como está a sua vida?
Padre Marcelo Rossi - Uma loucura, uma correria, mas uma benção.
ISTOÉ - O senhor tem hábito que repete todos os dias?
Padre Marcelo - Orar, todos os dias.
ISTOÉ - Que horas o senhor acorda?
Padre Marcelo - É relativo, porque estou viajando toda semana por
conta dos autógrafos. Tem sido complicada a rotina. Tenho viajado toda segunda
e voltado na quarta. Mas normalmente acordo 3h ou 4h da manhã.
ISTOÉ - A primeira oração ainda é na cama?
Padre Marcelo - Não, a oração é na capela. Na cama eu acordo e
agradeço a Deus.
ISTOÉ - O que come de café da manhã?
Padre Marcelo - Não gosto de tomar nada de café da manha, apesar de
saber que e errado. Geralmente almoço mais cedo, antes do meio dia.
ISTOÉ - Qual é a primeira atividade do dia?
Padre Marcelo - Oração.
ISTOÉ - O senhor ainda tem os cachorros?
Padre Marcelo - Sim, ainda tenho.
Cuido todos os dias. Quando não posso, tem uma pessoa que cuida quando estou
viajando. Na Cúria são dois cachorros. Um fila gigante e um dog alemão.
ISTOÉ - Que horas costuma almoçar?
Padre Marcelo - Antes do meio dia.
ISTOÉ - O que gosta de comer?
Padre Marcelo - Descobri que tenho intolerância a glúten, me faz
mal. Gosto de variar os pratos, não tem um em especial.
ISTOÉ - Como gosta de passar o tempo livre?
Padre Marcelo - Descansando.
ISTOÉ - Ainda tem uma hora para se exercitar?
Padre Marcelo - Agora com essa correria tem sido mais complicado,
mas procuro quatro vezes por semana fazer esteira e fisioterapia. Estou ainda
com a perna em recuperação.
ISTOÉ - O senhor ensaia todos os dias?
Padre Marcelo - Não, nunca ensaio nem faço exercícios, não dá
tempo. Gostaria de fazer um curso de inglês, mas não tenho tempo.
ISTOÉ - Quando precisa se deslocar, o senhor ainda dirige?
Padre Marcelo - Tenho um Fiat Doblô. Parei de dirigir aos 40 anos.
Prefiro não dirigir, apesar de adorar. É mais pratico, tenho um motorista, não
preciso estacionar o carro.
ISTOÉ - O que te dá mais prazer atualmente? Cantar? Escrever?
Padre Marcelo - O que me da mais prazer e evangelizar, seja qual
for o meio: internet, celebrando a Santa Missa.
ISTOÉ - O senhor ainda administra o sacramento da confissão? Dá
tempo?
Padre Marcelo - Para a minha equipe sim. Lembrando que quando falo
de minha equipe são mil pessoas.
ISTOÉ - Quando o senhor vai fazer um show, costuma se reunir com a
banda antes
Padre Marcelo - Não faço shows, eu classifico como eventos e dentro
do Santuário, são missas celebradas, são missas com participação do povo. Sou
reitor do Santuário. Não faço shows. Tenho uma base, que é o Santuário. Sempre
reúno e rezo com eles. O restante vai fluindo. Cada missa é uma missa. Nada é
muito combinado. A banda já me conhece pelo olhar. Dou o tom e eles vão junto.
ISTOÉ - O senhor está sempre de tênis. Por que?
Padre Marcelo - Estou usando tênis por conta do impacto, ordens
médicas por conta do joelho. E não sapato, que não é apropriado agora. Não
escolho, tenho três ou quatro e vamos fazendo revezamento.
ISTOÉ - Além de Deus e Jesus, tem alguém que está sempre com o
senhor?
Padre Marcelo
- Tenho, o Chicão, meu motorista que sempre está comigo. Me ajuda a conectar o
programa da Rádio Globo quando estou fora de casa, com o aparelho matrix. E em
tudo mais que for necessário.
ISTOÉ - O senhor usa celular? Usa o computador?
Padre Marcelo - Tenho celular, Nextel e um iPhone, que não uso
tanto. Mas tenho um iPad e um notebook, sou conectado na medida que dá tempo.
Hoje a internet é um meio muito importante para a evangelização.
ISTOÉ - Como a música passou a fazer parte da sua vida?
Padre Marcelo - Desde criança. Eu me pego cantarolando desde o
Seminario, onde formei uma banda e era vocalista.
ISTOÉ - Qual é o seu ritual antes das apresentações?
Padre Marcelo - Apresentação não, missa. Tomo cuidado com a roupa
litúrgica que vou colocar, que esteja de acordo com o momento.
ISTOÉ - Aos músicos é indicado algum tipo de conduta durante as
viagens ou nos dias de apresentação?
Padre Marcelo - Eles raramente, muito raramente viajam. Nas tardes
de autógrafo sou só eu e uma equipe pequena do Santuário que ajuda na
organização.
ISTOÉ - O senhor tem sono tranquilo, sonha bastante?
Padre Marcelo - Tenho sono tranquilo. Só tenho pesadelo quando como
pizza de noite.
ISTOÉ - Quando começa a escrever um livro, como muda sua rotina?
Padre Marcelo - Na verdade só consigo escrever parando tudo.
Agapinho fiz nas minhas férias e o Ágape foi quando quebrei o pé. Desconecto de
tudo, menos do programa da Rádio Globo. Tenho que estar focado para escrever.
ISTOÉ - Qual o ritual que o faz relaxar quando chega em casa depois
de um dia de compromissos?
Padre Marcelo - Assistir um filme. Já assisti todos da locadora ao
lado.
ISTOÉ - Poderia citar um episódio marcante de um encontro
inesperado com um fiel?
Padre Marcelo - Uma vez marcante foi uma senhora que me viu quando
eu ainda dirigia. Estava na rua e ela começou a me fechar e eu subi
literalmente em cima da calçada. Ela parou, se ajoelhou e pediu uma benção, foi
aí que comecei a me preocupar e achei que era melhor parar de dirigir.
ISTOÉ - Com que frequência visita seus pais e vê suas irmãs?
Padre Marcelo - No mínimo três vezes por semana, eles vem até mim
no Santuário.
ISTOÉ - O senhor gosta de sair para jantar? Costuma fazer programas
com amigos e amigas, como sair para ver filmes, exposições, correr em parques?
Padre Marcelo - Não da para sair, ir em supermercado, restaurante.
ISTOÉ - O senhor chora com frequência?
Padre Marcelo - Eu sou muito emotivo. Qualquer coisa eu me
emociono. Muitas vezes no programa da rádio ouvindo um testemunho. Não chorar,
mas emoção, das lágrimas escorrerem dos olhos.
ISTOÉ - Como
é que o senhor se enxerga daqui a alguns anos?
Padre Marcelo
- Com mais experiência. Mas trocaria por 3 corpos de 18 anos.
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Que Deus abençoe a todos.
Alexandros Meimaridis
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