domingo, 8 de novembro de 2015

UMA ABORDAGEM POUCO ORTODOXA DOS CHAMADOS EVANGÉLICOS



O artigo abaixo foi publicado pelo site da Revista Superinteressante da Editora Abril.

Evangélicos

Não dá mais para fingir que não vemos. Um a cada cinco brasileiros já é evangélico - e o número continua crescendo. Se você quer entender o Brasil e antever o futuro, precisa antes saber como isso foi acontecer.

Por Redação da Revista Supernteressante

O texano Kenneth Hagin, nascido em 1917, era uma criança doente. Desde os 9 anos, ficou confinado na casa do avô. Aos 16, desenganado pelos médicos, infeliz e preso a uma cama, tinha poucas esperanças de ver sua vida melhorar. Um ano depois, em agosto de 1934, Hagin teve uma revelação. Ele compreendeu de repente o significado de um versículo do Evangelho de São Marcos. A passagem do Novo Testamento dizia: “Tudo quanto em oração pedires, credes que recebeste, e será assim convosco”. Hagin então ergueu as mãos para o céu e agradeceu a Deus pela cura, mesmo sem ver sinal de melhora. Então levantou-se da cama. Estava curado.

A mensagem, que Hagin popularizou por meio de mais de 100 livros, é clara: Deus é capaz de dar o que o fiel desejar. Basta ter fé e acreditar que as próprias palavras têm poder. Sendo assim, para os verdadeiros devotos, nunca faltará dinheiro ou saúde. Essa doutrina ficou conhecida como “teologia da prosperidade”. A crença foi incorporada anos depois por várias igrejas. Ela é central no mais impressionante fenômeno religioso do Brasil contemporâneo: a explosão evangélica.

No começo, essa explosão se deu em silêncio, praticamente ignorada pelas classes médias. Os templos evangélicos surgiam nas cidadezinhas perdidas e nas periferias miseráveis das metrópoles. Já não é mais assim. No primeiro dia de 2004, a Igreja Pentecostal Deus é Amor inaugurou no coração de São Paulo o seu novo templo. A obra tem tamanho de shopping center, arquitetura de gosto duvidoso e comporta 22 mil pessoas sentadas.
É cinco vezes maior que a católica Catedral da Sé, lá perto.

Há meio século os evangélicos são a religião que mais cresce no país. Nos últimos 20 anos, mais que triplicou o número de fiéis: de 7,8 milhões de pessoas em 1980 para 26,4 milhões em 2001, um pulo de 6,6% para 15,6% da população brasileira. Em 2010 já ultrapassava os 40 milhões, Hoje representa cerca de 22% de toda população brasileira. Em algumas cidades, foram criados vagões de trem exclusivos para crentes, em que as pessoas podem viajar ouvindo pregações bíblicas. Em outras, não parece longe o dia em que eles representarão mais de 50% dos habitantes. Com mais de 400 anos de atraso, finalmente estamos sentindo os efeitos da Reforma protestante que varreu a Europa no século 16.

Um terreninho do Céu

Evangélicos, é importante esclarecer, é a mesma coisa que protestantes. As duas palavras são sinônimas. Ou seja, evangélicas são praticamente todas as correntes nascidas do racha entre o teólogo alemão Martinho Lutero e a Igreja Católica, em 1517. O alemão estava especialmente chateado com o comportamento dos padres, que, segundo ele, tinham virado corretores imobiliários do céu, comercializando indulgências – vagas no Paraíso para quem pagasse.

Lutero abriu a primeira fenda no até então indevassável poder papal sobre as almas do Ocidente. A ele se seguiram outros. Na Inglaterra, o rei Henrique VIII criou sua própria dissidência do catolicismo – depois batizada de anglicanismo – só porque o papa não queria que ele se divorciasse e casasse de novo. Na Suíça, Ulrico Zwinglio e João Calvino aprofundaram as reformas de Lutero. Zwinglio pregava o princípio que fundamentaria todo o movimento: o cristão deve seguir apenas a Bíblia (os católicos aceitam influências de teólogos, como Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino). Já Calvino foi o responsável pela introdução do puritanismo, que combinava regras rígidas de conduta com uma fervorosa dedicação ao trabalho. No começo do século 20, o sociólogo alemão Max Weber publicou o texto clássico A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, no qual atribui a essa invenção de Calvino o sucesso do capitalismo em países evangélicos.

Todos esses movimentos estimulavam o fim do monopólio da Igreja sobre a interpretação da Bíblia. Cabia a todo e qualquer cristão ler as Escrituras e tirar delas o que quisesse. Os protestantes recusavam a idéia de que um único líder – o papa – deveria guiar os rumos da religião. Foi isso que começou a fragmentação do movimento em diversas correntes, com pequenas diferenças doutrinárias. Surgem os batistas, os metodistas, os presbiterianos...

Mas o Brasil colonial passou quase imune à avalanche protestante. Houve apenas algumas exceções, como os calvinistas franceses e holandeses que invadiram o país – o primeiro culto evangélico por estas terras foi celebrado por franceses no Rio de Janeiro, em 1557, só 57 anos depois da missa católica inaugural. Era proibido realizar cultos de qualquer religião que não o catolicismo no território português.

A liberdade religiosa no Brasil só veio com a independência, na Constituição de 1824, ainda que impondo restrições de que as reuniões acontecessem em locais que não tivessem “aparência exterior de templo”. No mesmo ano, alemães fundaram a primeira comunidade luterana do Brasil. Logo depois chegaram as correntes missionárias, como os metodistas, dispostas a pregar nas ruas para salvar almas. Eles caíram nas graças da elite intelectual republicana que, impressionada com a “ética protestante”, defendia a presença de evangélicos como condição para a modernização do país.

Mas os protestantes que prosperaram no Brasil pouco tinham a ver com a tal ética protestante de Weber. No início do século 20, a fundação de duas igrejas seria decisiva para definir o perfil evangélico nacional: a Congregação Cristã no Brasil, inaugurada em São Paulo pelo italiano Luigi Francescon, em 1910, e a Assembléia de Deus, aberta um ano depois em Belém pelos suecos Gunnar Vingren e Daniel Berg. Apesar da origem européia, eles chegaram ao país via Estados Unidos, onde se envolveram com uma nova corrente protestante, o pentecostalismo, um grupo que crescia em popularidade por lá desde a virada do século.

Começou aí o que o sociólogo Paul Freston chama de “a primeira onda do pentecostalismo brasileiro”. O movimento era desaprovado tanto por católicos quanto pelos protestantes “históricos”, como são conhecidas as correntes diretamente ligadas a Lutero e Calvino. Nem uns nem outros gostavam da principal característica da doutrina pentecostal: a exacerbação dos poderes sobrenaturais do Espírito Santo (a palavra “pentecostalismo” vem de uma passagem da Bíblia que diz que, num dia de Pentecostes – a Páscoa judaica –, o Espírito Santo desceu aos apóstolos e começou a operar milagres). O mais notável desses poderes é a capacidade que Deus tem de curar imediatamente qualquer problema de saúde – daí as cenas de aleijados abandonando muletas e míopes pisando nos óculos. O pentecostalismo cresceu na classe baixa, promovendo cultos de adoração fervorosa e improvisada, bem dissonantes dos protestantes tradicionais, tão formais quanto contidos.

Para participar das novas congregações, os fiéis eram obrigados a se submeter a rígidas normas comportamentais. Os pentecostais eram os “crentes” estereotípicos: mulheres de cabelos compridos e saia, homens de terno e Bíblia na mão. As palavras essenciais para entender suas rotinas de vida são ascetismo, ou a recusa de usufruir os prazeres da carne, e sectarismo, o isolamento do restante da sociedade. Por trás delas, está a idéia de que o cristão deve se manter concentrado em Deus. Só assim ele pode evitar que o Diabo ganhe espaço na sua vida. Para os pentecostais, o mundo é simples: o que não é de Deus é o Diabo.

A Deus é Amor, aquela que acabou de abrir um megatemplo no centro de São Paulo, é uma das mais rigorosas entre as pentecostais. Ela proíbe freqüentar praias, praticar esportes ou participar de festas. Às mulheres, é vetado cortar o cabelo e depilar. Crianças com mais de 7 anos não podem jogar bola, graças a um versículo bíblico que diz “desde que me tornei homem, eliminei as coisas de criança”. Tantas regras têm compensação: para os pentecostais, o melhor da vida está reservado aos fiéis para depois da morte.

Até a década de 50, esse modelo reinou sozinho no pentecostalismo nacional. Fez sucesso, mas ficou restrito a grupos relativamente pequenos. A chegada da “segunda onda”, no entanto, traria uma novidade. É o que se convencionou chamar de “neopentecostalismo”. Em 1951 desembarcou aqui a Igreja do Evangelho Quadrangular, inaugurando no país o pentecostalismo de costumes liberais. “Todas essas igrejas que fazem sucesso hoje são nossas filhas, netas ou bisnetas”, diz o pastor Neslon Agnoletto, do conselho nacional da Quadrangular. De fato, inovações como os hinos com ritmos populares, a forte utilização do rádio e regras de comportamento menos duras, todos ingredientes indispensáveis do “evangelismo de massas”, foram práticas importadas pela Quadrangular, fundada nos Estados Unidos em 1923.

Deus é um office-boy

Para resumir, neopentecostalismo quer dizer que Monique Evans, Gretchen e Marcelinho Carioca podem agora se considerar “crentes”. Para isso, algumas adaptações aconteceram: saem os homens de terno e as mulheres de pêlos nas pernas, entram pessoas que se vestem com roupas comuns e não se animam a seguir normas rígidas de conduta. A primeira inovação foi riscar do mapa o ascetismo, o sectarismo e a crença de que a melhor parte da vida está reservada para o Paraíso. “A preocupação dos neopentecostais é com esta vida. O que interessa é o aqui e o agora”, afirma o sociólogo Ricardo Mariano, autor de Neopentecostais – Sociologia do Novo Pentecostalismo no Brasil.

Outra diferença é a radicalização da divisão do Universo entre Deus e o Diabo. Para os neopentecostais, os homens não são responsáveis pelos atos de maldade que cometem: é o Diabo que os leva a pecar. Numa sessão de descarrego da Igreja Universal, o pastor explicou que, se o fiel enfrenta um problema há mais de três meses, é provável que esteja carregando um encosto. “Se a dificuldade completar um ano, daí não há dúvida: a culpa é do demônio”, disse para a congregação. Ele não se referia só a entraves financeiros ou comportamentais. A receita vale para tudo, inclusive para doenças incuráveis. Assim, expulsar o demônio do corpo é a receita única para todos os males, de casamento infeliz até câncer no pulmão.

O ritual é feito aos gritos de “sai, capeta”, às vezes com lágrimas escorrendo pelo rosto e transes que terminam no exorcismo. Os cultos tornaram-se mais ativos, incluindo aplausos para Jesus e música gospel. Mas a inovação mais profunda do neopentecostalismo foi a aplicação da teologia da prosperidade, aquela exposta no primeiro parágrafo desta reportagem. Graças a ela, o neopentecostalismo ganhou o apelido de “fé de resultados”.

“A teologia da prosperidade faz o fiel encarar Deus como um office-boy”, diz o cientista da religião e pastor Paulo Romeiro, autor de Supercrentes – O Evangelho Segundo os Profetas da Prosperidade. “O crente dá ordens e determina o que pretende. Não há qualquer reconhecimento das fragilidades humanas e de suas necessidades em relação a um Deus superior”, afirma Romeiro. No Brasil, além da Universal, a Renascer em Cristo, a Sara Nossa Terra e a Internacional da Graça de Deus adotam a teologia da prosperidade.

A força de enxurrada com que o neopentecostalismo cresceu desorganizou todo o protestantismo. “Há uma verdadeira perda de identidade no movimento evangélico mundial. O pentecostalismo flexibilizou suas exigências comportamentais e até os protestantes históricos passaram a aceitar a participação mais ativa do fiel no culto e algumas manifestações sobrenaturais”, afirma o pastor batista Joaquim de Andrade, pesquisador da Agência de Informações da Religião. Mais e mais, boa parte do mundo protestante aceita a teologia da prosperidade.

A onda de mudança foi bater até onde a Reforma de Lutero não tinha chegado: nas praias do catolicismo. A influência neopentecostal sobre a renovação carismática católica é tão grande que seu maior expoente no Brasil, padre Marcelo Rossi, é acusado de ter gravado hinos religiosos tirados de templos evangélicos.

Promessas de um novo mundo

Mas por que cada vez mais pessoas abandonam suas religiões para tornarem-se evangélicas? Nos anos 60, a nova religião era vista como uma forma de migrantes de zonas rurais enfrentarem a falta de valores e regras da sociedade moderna e estabelecerem relações de solidariedade na metrópole. Demorou dez anos para essa hipótese ser desacreditada por estudos que mostraram que as igrejas eram compostas igualmente pelos pobres nascidos e viventes na cidade e no campo.

Houve espaço para teorias conspiratórias: o avanço evangélico seria um plano dos Estados Unidos (ou do Diabo) para dominar a América Latina. A hipótese foi defendida a sério pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil, que na década de 80 enviou memorando ao Vaticano, citado no livro de Mariano, afirmando que a CIA, aliada à direita brasileira, acelerava a “expansão dessa religião alienante no continente para frear a proliferação da Igreja Católica progressista”.

Mas essas explicações não convencem ninguém e o avanço neopentecostal exigiu um novo foco nos estudos. Em seu mais recente trabalho, o ainda não publicado “Análise Sociológica do Crescimento Pentecostal no Brasil”, Mariano afirma que as motivações para a conversão estariam nas soluções mágicas oferecidas. “Uma grande parcela da população não tem acesso ao serviço de saúde – e, quando tem, recebe atendimento precário e mal entende os médicos. É muito mais fácil, e faz mais sentido, acreditar que os problemas são causados pelo demônio e se tratar na igreja”, afirma o sociólogo.

Não é apenas a questão médica que está em jogo. A dualidade entre Deus e o Diabo é uma das mais eficientes respostas para a eterna pergunta sobre como é possível existirem tantas coisas ruins. Um presidiário pode culpar a influência do demônio pelo passado violento – uma explicação para o sucesso da religião nas prisões. Essa dualidade também pode estar na raiz da popularidade evangélica entre ex-viciados em drogas – e de sua comprovada eficácia na luta contra o vício. O apelo pode efetivamente ajudar ex-criminosos e ex-viciados a deixarem seus “maus hábitos” para trás. Com isso, os neopentecostais respondem satisfatoriamente às questões dos nossos tempos – coisa que outras religiões nem sempre conseguem fazer.

Juntando tudo, o que se tem é uma religião que escancara uma ambição materialista e imediata na relação com Deus. Um apelo e tanto, que parece ter especial atração para os mais pobres. Estaríamos, portanto, diante de uma mudança naquilo que as pessoas esperam da experiência religiosa? “Não”, responde o estudioso de religiões Antonio Flávio Pierucci, da Universidade de São Paulo. “A maior parte das religiões tem esse viés materialista. As pessoas sempre rezam com o objetivo de pedir e receber algo. A diferença é que os evangélicos assumem essa faceta sem se envergonhar.”

Seria injusto, no entanto, listar apenas explicações sociológicas para justificar a onda de conversões. Poucas religiões têm tanta disposição para atrair fiéis como os evangélicos. Templos são abertos nos mais distantes rincões e pastores dedicam-se com fervor. As igrejas estão à frente das demais no entendimento de que evangelizar é como convencer um consumidor a comprar. “Os depoimentos de fiéis na TV e no rádio são o apelo de marketing para demonstrar a eficiência dos serviços”, diz Ari Pedro Oro, antropólogo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e organizador do livro Igreja Universal do Reino de Deus. As igrejas seduzem com um produto atraente e oferecem bom serviço. São religiosamente adeptas da mais pura e simples mentalidade empresarial.

Crescei e mutiplicai

Em novembro do ano passado, um evangélico foi ao Programa do Ratinho pedir a devolução dos dízimos que havia dado à igreja. Argumentava que o pastor lhe prometera prosperidade em troca do dinheiro. Sem melhorar de vida, o fiel, como se fosse um consumidor lesado, foi ao Ratinho pedir o dinheiro de volta.

Essa história ilustra de modo brilhante a relação que as neopentecostais criaram com seus fiéis-clientes. Elas prestam um serviço. E eles pagam. É bom lembrar que dar dinheiro a Deus, seja através da caridade ou de doações, é parte da doutrina de diversas religiões, incluindo todas do braço judaico-cristão. Com a teologia da prosperidade, no entanto, o dinheiro ganhou nova função. Agora é preciso dar para receber. Num de seus livros, Edir Macedo, o líder da Universal, explica que devemos formar uma “sociedade com Deus”. “O que nos pertence (nossa vida, nossa força, nosso dinheiro) passa a pertencer a Deus; e o que é d’Ele (as bênçãos, a paz, a felicidade, a alegria, tudo de bom) passa a nos pertencer”, afirma o bispo.

É uma leitura polêmica do Evangelho. A idéia de que dar dinheiro é parte de uma relação de troca com Deus desperta calafrios em muitos religiosos. “É uma contradição. A Reforma protestante começou justamente porque Lutero se levantou contra a venda das indulgências”, diz o pastor Paulo Cezar Brito, líder da Igreja Evangélica Maranata, uma pentecostal que rejeita a teologia da prosperidade.

“Templo é dinheiro”, diz a maldosa adaptação do ditado popular. “Deus é o caminho, Edir Macedo é o pedágio”, diz outra. Na cabeça de muita gente, as igrejas evangélicas são ótimas opções de carreira para quem pretende enriquecer facilmente. Não dá para negar que muitos realmente ganharam dinheiro com a fé alheia – em especial os líderes das grandes igrejas. Como em qualquer empresa moderna, pastores hábeis que trazem muito dinheiro para a igreja ganham bem – ninguém confirma a informação, mas comenta-se que alguns salários se parecem com os de astros de futebol, na casa das várias dezenas de milhares de reais. Mas essas afirmações escondem também um preconceito. Em termos legais, não há diferença entre um templo evangélico e qualquer outro local de cultos religiosos. A Constituição garante a todos – evangélicos, católicos ou budistas – a mesma isenção de vários tributos, entre eles o IPTU e o Imposto de Renda.

Além disso, o crescimento da concorrência faz ser cada vez mais difícil sobreviver entre tantas denominações evangélicas. Calcula-se que uma congregação precise ter no mínimo 50 integrantes para recolher dízimos e doações em quantidade suficiente para cobrir as despesas mínimas, como aluguel e contas de luz e água. Nessas horas, ser a religião dos pobres não é vantagem. Por isso, cada denominação procura seu nicho de atuação. A Assembléia de Deus prefere abrir templos dentro de bairros isolados, enquanto a Universal opta pelas grandes vias de acesso – uma decisão que pouco tem a ver com a fé, segue mais a lógica da competição de qualquer mercado capitalista.

O maior país católico do mundo pode estar se tornando uma nação de maioria evangélica? Dificilmente, concorda a maioria dos especialistas. Mas eles discordam na hora de prever o ritmo do crescimento. De um lado, estão os que acham que o boom já passou e que a Igreja Católica, com a renovação carismática, equilibrou o jogo. Do outro, pesquisadores que veem no frágil compromisso dos brasileiros com a religião um prato cheio para os neopentecostais. Cerca de 80% dos nossos católicos se dizem não-praticantes. É um enorme mercado para os evangélicos.

Não é à toa que a maioria dos convertidos vem do catolicismo. Mas, na hora de afirmar a identidade e escolher um adversário, o pentecostalismo ataca o candomblé e a umbanda. E vai na jugular, às vezes escorregando para a intolerância religiosa. Em quase todos os templos é possível ouvir que essas religiões cultuam o Diabo. Também há casos de ataques a terreiros estimulados por pastores. Pode-se dizer que a briga contra as religiões afro-brasileiras, e não contra o catolicismo, o verdadeiro rival, seja uma estratégia de marketing. Quando enfrentaram os católicos, os evangélicos levaram um contra-ataque duro, que envolveu denúncias de charlatanismo e estelionato e ameaçou a sobrevivência das igrejas, além de provavelmente afastar fiéis. A popularidade dos evangélicos chegou ao fundo do poço quando um pastor da Universal chutou na TV uma estátua de Nossa Senhora Aparecida (os evangélicos não cultuam imagens).

Mas, embora esses episódios possam dar a impressão de que o fanatismo religioso esteja em alta no Brasil, muitos especialistas defendem a tese de que o crescimento evangélico seja um indício do contrário: de que cada vez mais gente rejeita a religião. É o que sugerem pesquisas mostrando concentrações de evangélicos nas mesmas regiões onde há altos índices de pessoas “sem religião” – caso do estado do Rio e da zona leste paulistana. “As pessoas estão experimentando uma nova crença. Se perceberem que não está dando certo, que Deus não é tão fiel, podem desistir da busca”, diz o sociólogo Pierucci. “Abandonar a religião oficial é o primeiro passo de saída do mundo religioso”, afirma.

Um indício de que a conversão ao mundo evangélico significa um arrefecimento do fervor religioso é o fato de que as neopentecostais exigem poucas mudanças nos fiéis. O resultado é que, quanto mais crescem, menos os evangélicos mudam a cara do país – bem ao contrário da revolução que ocorreu na Europa com as idéias de Lutero e Calvino. Prova disso é a programação da Rede Record, comprada pela Igreja Universal com o dinheiro do dízimo, que pouco difere das concorrentes.

Talvez o trunfo evangélico para conquistar almas seja sua capacidade de adaptação. Com a rejeição à centralização da interpretação bíblica herdada da Reforma protestante, qualquer um pode abrir um templo e pregar como quiser. Assim, enquanto seus “irmãos” se expandiam em áreas pobres, a Igreja Bola de Neve cresceu 1 100% em três anos orando para os ricos. Seus dez templos, cuja marca registrada são as pranchas de surfe como púlpito e os hinos religiosos em ritmo de reggae, funcionam em áreas de classe média-alta de São Paulo e cidades de praia como Florianópolis, Itacaré e Guarujá. O público são jovens da classe A e B, com curso superior. Para quem está acostumado a fiéis pobres e pouco instruídos, a Bola de Neve é uma surpresa desconcertante. Para os evangélicos, somente mais uma prova de que a obra de Deus chegará a todos os corações.

Sérgio Gwercman

O artigo original poderá ser visto por meio do seguinte link:


NOSSO COMENTÁRIO

O artigo apesar de falho em vários aspectos tem méritos e deve ser lido por todas as pessoas interessadas no fenômeno que atende pelo nome de “Evangélicos”.

Que Deus abençoe a todos.

Alexandros Meimaridis

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