Crivella se afastou de tom
religioso na campanha à prefeitura do Rio
O artigo abaixo foi publicado no
site DW.
O
avanço dos evangélicos, agora também no Executivo
Vitória de Marcelo Crivella no
Rio é marco na trajetória de pastores na política brasileira. Segundo especialistas,
conquista de prefeituras faz parte de projeto amplo de ocupar governos e até
mesmo a Presidência.
A vitória do bispo licenciado
Marcelo Crivella na eleição municipal do Rio de Janeiro, neste domingo (30/10),
marca uma nova etapa na trajetória dos pastores evangélicos na política
brasileira. Eleito com 59,37% dos votos válidos, Crivella vai comandar a
prefeitura da segunda maior cidade do Brasil e uma das principais vitrines do
país, com orçamento de 31 bilhões de reais.
Com essa vitória, o projeto
político dos pastores evangélicos finalmente conseguiu ir além do nicho que vem
sendo cultivado na Câmara Federal – além dos Legislativos estaduais e
municipais – e mostrar que também tem força em eleições majoritárias.
Sua ascensão também deve
catapultar a influência do PRB, o partido dominado por membros da Igreja
Universal do Reino de Deus (IURD). A denominação religiosa é comandada por Edir
Macedo, que é também tio de Crivella e controla a Rede Record, a segunda maior
emissora de TV do país. "É uma igreja com um projeto de poder que
apresenta condições de colocá-lo em prática. A própria estrutura da Universal
parece a de um partido ou de uma empresa", afirma Edin Abumanssur,
professor de Sociologia da Religião da PUC-SP.
O PRB registrou um aumento de 31%
no número de prefeitos e 33% no de vereadores nestas eleições. Em 2017, vai
administrar 105 prefeituras. Mas o avanço dos evangélicos não se deu apenas com
o PRB.
Neste ano, as 26 capitais
brasileiras contaram com mais de 250 candidatos que se identificaram como
"pastores", "missionários" ou "bispos" de
diversas denominações. Na cidade como São Paulo, a bancada de evangélicos subiu
de sete para treze vereadores (quase um quarto do total da Câmara).
A ascensão de Crivella e de
outras figuras é influenciada pelo aumento da proporção de evangélicos no país.
O Brasil continua sendo o maior país católico do mundo, mas o último censo
mostrou que a população de evangélicos subiu de 15,4% em 2000 para 22,2%
naquele ano. Segundo pesquisa do instituto Datafolha, 33% dos 4,9 milhões de
eleitores registrados no Rio se identificam como evangélicos. Um levantamento
antes do pleito mostrou que 91% deles apoiavam a candidatura de Crivella.
Imagem e retórica
Políticos evangélicos já exercem
influência decisiva na política carioca e fluminense desde o final dos anos 90.
O Estado do Rio já foi governado entre 1999 e 2006 por uma orquestração de
políticos evangélicos que contou com Anthony Garotinho. Só que nenhum deles
iniciou a trajetória política nas fileiras de uma igreja ou é tão fortemente
identificado com uma denominação específica como Crivella, que se licenciou
como bispo da IURD para disputar sua primeira eleição para o Senado, em 2002.
Para vencer a prefeitura do Rio,
Crivella acabou tendo que moderar seu tom. Em 2008, quando se lançou pela
primeira vez à prefeitura, foi derrotado ainda no primeiro turno. À época, fez
uso de discurso religioso e provocou controvérsia ao atacar um de seus
adversários, que defendia direitos de homossexuais, afirmando com desprezo que
este promovia "o homem com homem".
Megatemplo da Igreja Universal em
São Paulo
"Nem todo o Brasil é
evangélico. Eles podem formar uma bancada numa eleição proporcional, mas esses
votos não são suficientes para conquistar o Executivo. Para ir além dos seus
fiéis, os políticos evangélicos têm que fazer concessões, especialmente no tom
religioso. Elas não precisam tanto ser nos costumes, já que o brasileiro em
geral é conservador", afirma Abumanssur.
Para Christina Vital, professora
de Ciências Sociais da Universidade Federal Fluminense (UFF), Crivella ofereceu
diferentes motivos para votar do que simplesmente a religião. "Ele
enfatizou muito o discurso do cuidado com a população, sobre a qualidade dos
serviços. A própria IURD tem um lado liberal na economia que tem apelo entre
empresários. No Legislativo, os pastores podem falar só para sua base, mas no
Executivo tem que falar com toda a sociedade", afirmou.
Em um debate na eleição deste
ano, Crivella exemplificou sua nova abordagem para conquistar eleitores fora do
nicho evangélico ao responder a uma acusação de um adversário. "Você está
preocupado com a minha igreja? E a fila dos hospitais? Interessa para eles se
eu sou católico, espírita, umbandista ou evangélico?", disse o político na
ocasião.
O candidato chegou a dizer na TV:
"eu jamais misturei política com religião" – apesar de sua ficha
demonstrar que isso não é verdade. No Senado, ele promoveu projetos que
beneficiavam diretamente igrejas, como uma proposta de isentar do pagamento de
IPTU os imóveis alugados utilizados para cultos.
Voos mais altos
Para Abumanssur, mesmo que
Crivella tenha apenas disfarçado sua tendência religiosa, não vai ser tão
simples para ele implementar uma agenda religiosa numa cidade como o Rio.
"Existem questões jurídicas e políticas difíceis de contornar. A principal
pauta dos evangélicos está ligada aos costumes. Só que isso não é tema de
competência de uma prefeitura", afirmou.
Segundo Abumanssur, o provável
papel de Crivella será de mostrar a um público mais amplo que pastores são
capazes de administrar uma cidade. "Não tenho dúvidas de que a Universal
quer alçar voos mais altos."
Vital também afirma que Crivella
deve deixar a religião de lado na administração e mostrar uma face amigável de
políticos religiosos. "Existem, sim, áreas em que se pode promover uma
agenda religiosa em uma prefeitura, como a educação. Mas Crivella deve se
concentrar em fazer uma gestão eficiente para produzir uma vitrine para os
evangélicos e expandir o eleitorado", afirma. "Ele é parte de um
projeto amplo de ocupação do Executivo, que quer conquistar governos e até
mesmo a Presidência e que, aí sim, vai deixar sua marca na cultura e na
sociedade. Esse projeto envolvendo o Executivo também deseja influenciar o
Judiciário."
Em 2012, mesmo ano em que sugeriu
que os gays podem ser fruto de aborto malsucedido, Crivella declarou durante um
encontro com pastores da IURD registrado em vídeo que os brasileiros ainda vão
"eleger um presidente da República que vai trabalhar para nós e nossas
igrejas".
O artigo original poderá ser
visto por meio do link abaixo:
http://www.dw.com/pt-br/o-avan%C3%A7o-dos-evang%C3%A9licos-agora-tamb%C3%A9m-no-executivo/a-36216797
Que Deus abençoe a todos.
Alexandros Meimaridis
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