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quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

REDE GLOBO E A EXPLORAÇÃO DO ACIDENTE DA CHAPECOENSE



O artigo abaixo é de autoria do professor Wilson Roberto Vieira Ferreira. A expressão tautismo é um neologismo criado pelo francês Lucien Sfez que une as palavras tautologia ou repetição com autismo. Dessa maneira, o tauismo se refere a um indivíduo, ou organização, preso em seu próprio silêncio do mesmo modo em que um autista se encontra prisioneiro de sua fortaleza interior.

Globo expõe metástase do tautismo na tragédia da Chapecoense

Invasão de privacidade e exploração sensacionalista das emoções são traços generalizados na cobertura de grandes tragédias pela mídia. Porém, com a Globo há um elemento mais insidioso: depois de décadas exercendo o monopólio político e comunicacional no País, sua autocentralidade entrou em metástase através do tautismo (autismo + tautologia). A extensa cobertura da tragédia do desastre aéreo do time da Chapecoense deixou mais explícito esse estado patológico no qual a emissora só consegue olhar para além dos muros cenográficos do Projac através de referências que faz de si mesma. Do “turbilhão de emoções” da narração do velório coletivo por Galvão Bueno à insistência como repórteres e locutores tiveram que demonstrar a si mesmos emocionados (chegando a fazer “selfies” com celulares), chorando e até consolados pela mãe de um dos jogadores, é como se o tempo todo repetissem: “tenho emoções, logo a tragédia é real!”. Chegando a um surreal “Efeito Heisenberg”: o global Galvão Bueno narrando o outro global Cid Moreira lendo a Bíblia com a mesma inflexão de voz com que lia as notícias do “Jornal Nacional” e narrava as peripécias do Mister M.

O hábito do cachimbo entorta a boca. Por décadas a TV Globo usou e abusou do recurso de metalinguagem (falar de si mesma) como forma de demonstração do seu monopólio e poder absoluto na comunicação social brasileira: não se limitava transmitir um acontecimento. O acontecimento era a Globo transformando o acontecimento em notícia – o repórter sempre foi o protagonista da notícia enquanto a História sempre garantiu exclusividade e pioneirismo para a emissora.

A deferência como o técnico da Itália Enzo Bearzot tratou em toda Copa de 1982 o repórter Ernesto Paglia, a amizade exclusiva de Galvão Bueno com Airton Senna, a forma como praticamente a emissora salvou a cidade do Rio de Janeiro nas enchentes de 1966, a emissora que virou notícia de si mesma com o sequestro de William Waack por forças de segurança de Saddam Hussein na Guerra do Golfo, o jornalista Reginaldo Leme escrevendo o prefácio do livro do CEO da Fórmula 1 Bernie Eclestone etc.

Passagens que a emissora sempre fez questão em destacar, como se a História sempre conspirasse para as câmeras da Globo.

Embora mantenha seu poder econômico e político graças, entre outras coisas, ao BV (Bônus por Volume) para garantir a maior parte do bolo das verbas publicitárias, nos últimos anos a Globo vem sofrendo crescente queda nas audiências e a concorrência das tecnologias de convergência e Internet.

Como destacamos em postagem anterior, a reação global foi abandonar a estética space opera de Hans Donner (adotando um visual mais “orgânico”, deixando o artificialismo metálico) e mergulhar ainda mais na metalinguagem como demonstração de que ainda continua poderosa e influente –  veja artigo sobre esse assunto por meio do link abaixo:

http://cinegnose.blogspot.com.br/2014/05/globo-reaje-crise-de-audiencia-e.html

Porém, o cachimbo entortou a boca: essa obsessão pela metalinguagem entrou em metástase, resultando na patologia do tautismo – autismo + tautologia. De tanto falar de si mesma, criou o “fechamento operacional” de um sistema que se tornou obeso – a audiência já não sustenta a folha de pagamento, dependendo a emissora das gordas verbas publicitárias governamentais.

De tão obesa e fechada em si mesma, simplesmente a emissora não consegue mais ver o mundo do outro lado dos muros do Jardim Botânico e da cenografia do Projac. O exterior somente é traduzido a partir de uma descrição que a Globo faz de si mesma.

Ao lado das telenovelas, o futebol é prioridade comercial da TV Globo. Dona do futebol brasileiro (a ponto de “antecipar” com horas de antecedência resultado de sorteio da final da Copa do Brasil –  ver aqui: http://cinegnose.blogspot.com.br/2016/11/tautismo-da-globo-preve-resultado-de.html - a tragédia do acidente aéreo que vitimou o time da Chapecoense mereceu uma extensa cobertura. Sendo o auge a transmissão de seis horas do velório coletivo em Chapecó, na Arena Condá.

Para quem estuda a evolução das mídias, as transmissões ao vivo ou coberturas extensivas , principalmente de uma emissora em estado de metástase tautista, é uma oportunidade de obter flagrantes dessa tradução autorreferencial que a Globo faz do mundo. 

“Tenho emoções, logo a tragédia é real”

Que ao longo da evolução da linguagem televisiva os jornalistas deixaram de ser simples repórteres para se transformarem em protagonistas das notícias, não é nenhuma novidade.

Porém, na Globo esse traço do telejornalismo também alcançou a metástase: as imagens por si mesmas parecem não conseguir expressar a dimensão exata da tragédia e tristeza que se abateu sobre a Chapecoense, sua torcida e o País. Repórteres e locutores devem constantemente abandonar a função referencial da linguagem para insistirem na função emotiva, centrada no receptor – só para relembrar, há seis funções da linguagem: referencial (sobre o quê a comunicação fala), emotiva (emissor), conativa ou apelativa (receptor), poética (mensagem), fática (canal), metalinguagem (a comunicação falando dela mesma).


No contexto atual da emissora é sintomática a escolha de Galvão Bueno para narrar o velório coletivo em Chapecó. Se em 1994 o velório de Ayrton Senna em São Paulo, narrado ao vivo por William Bonner, deu um caráter jornalístico hard news para o evento, agora, com Bueno, parece que foi transferido para a editoria do jornalismo esportivo.

E não foi para menos. O registro solene jornalístico foi substituído pelo “turbilhão de emoções que não para” – sem conter a emoção, chorou: “não aguento mais”, disse perdendo a voz diversas vezes na transmissão.

O que fez a atenção do espectador diversas vezes concentra-se nele, chegando a comover internautas em redes sociais elevando seu nome mais comentados no Twitter.

É uma das características da linguagem tautista: fechada em si mesma, a imagem deve contar com redundância sígnica do emissor, da mesma maneira que o Papa Léguas tinha que sublinhar sua velocidade para as crianças (e, por isso, jamais o Coiote o pegaria) fazendo “bip-bip” como buzina de carro.

É como se Galvão Bueno quisesse dizer a todo momento: “vejam como estou emocionado, a tragédia é real!”. Assim como um correspondente ao vivo de Washington tem que se posicionar diante do Capitólio ou da Casa Branca para que o telespectador acredite que de fato o repórter está lá – autismo (a função emotiva supera a referencial) e tautologia (repetição na função emotiva daquilo que poderíamos ver apenas nas imagens).

Resultado: infantilização da transmissão, análoga à linguagem das onomatopeias dos desenhos animados.

“Vejam eu transmitindo, logo é verdade!”

A insistente centralidade no jornalista (como se ele antecedesse o próprio acontecimento) criou duas insólitas situações na cobertura dos eventos de Chapecó.

Na edição do Jornal Nacional do sábado (03/11) a repórter Kiria Meurer (da RBS, afiliada à Globo) parou diante do ônibus que levaria os familiares ao aeroporto onde seriam recebidos os corpos. “Eu consegui um lugarzinho aqui no ônibus, vou acompanhar esses familiares. A partir daqui, a nossa câmera, com o nosso cinegrafista, não pode gravar. Então vou gravando com o meu celular”, disse ela - assista ao vídeo por meio do link abaixo a partir dos 55:30 minutos:

https://www.youtube.com/watch?v=pbTkQgjbLx4

O auge foi quando Meurer filmou a si mesma com seu celular percorrendo a área do velório. Além da consciente invasão de privacidade (talvez um traquejo de anos de pauta sobre corrupção com câmeras secretas para mostrar corruptos amealhando dinheiro vivo – de novo o cachimbo entortou a boca), demonstra a obsessão metalinguística tautista de querer dizer sempre: “vejam eu transmitindo. Se transmito, então é verdade!”.
E o segundo episódio explícito de autorreferência metalinguística foi quando a mãe do goleiro Danilo, “num momento de tragédia pessoal encontrou forças para consolar o repórter Guido Nunes da SporTV”. E termina dizendo: “numa demonstração de respeito aos jornalistas que também morreram...” - veja o vídeo por meio do link abaixo:

https://www.youtube.com/watch?v=zTDCg1zbBNU

O paroxismo de Cid Moreira

Da metástase ao paroxismo. No ápice de um efeito Heisenberg (efeito no qual ao transmitir acontecimentos, a mídia na verdade transmite seus próprios efeitos nos acontecimentos – sobre esse conceito veja aqui: http://cinegnose.blogspot.com.br/2013/06/o-efeito-heisenberg-na-irrealidade.html -  eis que vemos um patibular Cid Moreira lendo trechos bíblicos em um episódio que jamais esse humilde blogueiro poderia imaginar nos mais loucos pesadelos: Galvão Bueno narrando Cid Moreira.

Jornalista e apresentador do Jornal Nacional da Globo por 27 anos, a aparição de Cid Moreira como protagonista na própria transmissão global do velório coletivo foi o sintoma mais explícito (o efeito Heisenberg) de uma cobertura na qual o tautismo foi generalizado.

 Nesse episódio, a Globo projetou involuntariamente a si mesma no próprio evento que transmitia.

Além de comprovar como, ao longo das décadas, a emissora conseguir dominar corações e mentes, de tal maneira que a busca por conforto espiritual à tragédia veio através da inflexão da voz familiar que entrou nas casas das famílias de Chapecó por décadas – dessa vez não mais dando notícias ou narrando as peripécias de Mister M, mas lendo versículos das cartas do apóstolo Paulo aos Coríntios.

“Nossos companheiros...”

Vinte profissionais de comunicação morreram no desastre aéreo, entre jornalistas, produtores, cinegrafista e locutores das emissores Globo, RBS, Fox, Rádio Oeste, Rádio Super Condá.

Mas somente os profissionais da Globo e afiliada RBS mereceram, desde o primeiro momento da cobertura, serem nomeados. Os restantes dos profissionais eram genericamente denominados como “nossos companheiros”. Ao longo da semana, apenas no canal fechado Globo News apresentou um infográfico objetivo com a lista completa com nome, foto e a emissora na qual cada um trabalhava.

Tanto nas edições do Jornal Nacional como no Fantástico passou a ser informada a lista completa dos profissionais, porém com a evidente autocentralização tautista que contamina a descrição que a Globo faz do mundo exterior: para cada profissional da Fox Sports citado, era destacado o período em que cada um deles havia trabalhado na SporTV, jornal O Globo, rádio Globo ou na TV Globo.

Ou seja, somente pareciam merecer figurar na descrição completa por serem ex-profissionais das organizações Globo.

Exploração sensacionalista das emoções e invasão de privacidade são elementos generalizados nas coberturas que a grande mídia sempre faz nas tragédias.

Mas na Globo há um elemento mais crônico: seu monopólio e estrutura obesa que não mais se sustenta (a não ser através da intervenção na política nacional) criou uma patologia (autocentralidade) que entrou em fase de metástase – o tautismo.

O artigo original poderá ser visto por meio do seguinte link:


Que Deus abençoe a todos.

Alexandros Meimaridis
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quinta-feira, 14 de agosto de 2014

A MORTE DE EDUARDO CAMPOS


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O material abaixo foi escrito por Leonardo Sakamoto e publicado o site do UOL notícias. O mesmo reflete com exatidão nossos próprios sentimentos.

Morte de Campos: a tentativa ignóbil de transformar a tragédia em piada

Por Leonardo Sakamoto

Nem bem a morte do candidato à Presidência da República Eduardo Campos em um acidente aéreo, nesta quarta (13/08/2014), foi confirmada e surgiram comentários com afirmações de mau gosto ou inferências políticas bizarras nas redes sociais.

Pessoas pedindo para que, no lugar de Campos, naquele jatinho, estivesse Aécio ou Dilma. Ou colocando a culpa em um ou em outro pelo acidente.

Não, isso não é piada. Muito menos revolta contra a política.

Há outro nome para esse tipo de ignomínia, para essa incapacidade crônica de sentir empatia com os passageiros de um avião que cai e com as pessoas que estavam em solo. Talvez essa impossibilidade de se reconhecer no outro e demonstrar algum apreço pela vida humana seja alguma forma de psicopatia grave.

O que não surpreende, pois tem o mesmo DNA das discussões estéreis e violentas levadas a cabo na internet, sob anonimato ou não. Mas não deixa de chocar.

Da mesma forma que choca alguns colegas jornalistas que no afã de prever o que vai acontecer com as eleições, analisam de forma desrespeitosa a situação, com ironias e sarcasmos que não cabem neste momento, desumanizando a cobertura da tragédia em busca de audiência.

É para isso que a gente desenvolveu tantas ferramentas tecnológicas com a justificativa de aproximar as pessoas e facilitar a comunicação? Para podermos mostrar como somos idiotas em tempo real? Se for assim, estávamos melhor com os tambores.

À família e aos amigos de Campos e de sua equipe e aos feridos entre os moradores de Santos, minha solidariedade. Aos que fazem disso uma brincadeira ou uma chance para vender mais, o meu eterno desprezo.

O artigo original de Leonardo Sakamoto poderá ser visto por meio do seguinte link:

http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2014/08/13/morte-de-campos-a-tentativa-ignobil-de-transformar-a-tragedia-em-piada/


Leonardo Sakamoto é jornalista e doutor em Ciência Política. Cobriu conflitos armados e o desrespeito aos direitos humanos em Timor Leste, Angola e no Paquistão. Professor de Jornalismo na PUC-SP, é coordenador da ONG Repórter Brasil e conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão.

Para pensar:

Mateus 16:24—27

24 Então, disse Jesus a seus discípulos: Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me.

25 Porquanto, quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a vida por minha causa achá-la-á.

26 Pois que aproveitará o homem se ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? Ou que dará o homem em troca da sua alma?

27 Porque o Filho do Homem há de vir na glória de seu Pai, com os seus anjos, e, então, retribuirá a cada um conforme as suas obras.

Que Deus abençoe a todos.

Alexandros Meimaridis

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terça-feira, 22 de julho de 2014

SURGE UMA NOVA RELIGIÃO DOGMÁTICA: A CIÊNCIA


Resultado de imagem para a verdade

O material abaixo foi publicado pelo site “Aleteia” cujo significado é VERDADE em grego.

Os cientistas se tornaram os sacerdotes de uma nova religião dogmática

E os novos ateus são os seus coroinhas fanáticos

Por M. ANTHONY MILLS

A crença religiosa é infantil, de acordo com Auguste Comte, o fundador da escola filosófica positivista. Essa ideia, de quase dois séculos de idade, virou um mantra no coro dos atuais "novos ateus". Acontece que este ponto de vista é danoso não tanto para a crença religiosa quanto para a própria proposta científica. Como disse Marx, a história se repete: primeiro como tragédia, depois como farsa.

Comte, que também fundou a disciplina da sociologia, foi um dos primeiros a estudar o conhecimento humano como produto de forças históricas, ou seja, sociais e culturais.

Comte considerava que, numa fase inicial, a mente humana se sente atraída por explicações ocultas de observações sensoriais, tais como forças personificadas e causas sobrenaturais. Ao progredir, o conhecimento humano entra num estágio "metafísico" distinto: neste segundo estágio, a mente reformula a sua busca de causas em termos racionais, mesmo que ainda sobrenaturais.

Essas duas fases podem ser sucedidas por uma terceira e última. Nela, o conhecimento se torna propriamente mundano pela primeira vez, enraizado nos dados positivos dos sentidos e nas manifestações derivadas deles. Este seria o nascimento da ciência moderna, positiva: a apoteose da razão humana.

Os novos
ateus também veem a religião como uma expressão de imaturidade cognitiva. Richard Dawkins escreve em “The God Delusion” [A Ilusão de Deus]: "Há algo de infantil na ideia de que alguém tem a responsabilidade de dar significado à sua vida". Ele contrapõe esta perspectiva à "visão verdadeiramente adulta".

A ideia comteana de que a filosofia tradicional foi ultrapassada pela marcha da ciência se tornou popular nos últimos tempos. Segundo este raciocínio, a investigação metafísica já foi produtiva, mas, na melhor das hipóteses, ficou estéril e, na pior, se reduziu a mera distração. Mera distração do quê? Da evidência incontestável dos nossos sentidos, nos quais se alicerça, supostamente, o conhecimento científico. "Tudo o que sabemos é o que observamos com os nossos sentidos e instrumentos [...] Não temos a menor ideia do que ‘realmente’ existe além disso", escreve Victor Stenger.

Mas os novos ateus e seus aliados ideológicos também evidenciam de outras maneiras a sua vulgarização comteana. Comte não só procurava deixar de lado os métodos teológicos e metafísicos do saber: ele queria substituí-los pela nova ciência positiva, que ele veio a chamar de “religião da humanidade”.

Religião precisa de doutrina; neste sentido, Comte considerou que as conclusões da "filosofia positiva", as invariáveis leis da natureza, poderiam substituir o dogma religioso. Isso exigiria uma “evangelização”. Assim, ele afirmou que as descobertas científicas devem ser sistematizadas e expostas por uma "classe especial de homens", que não seriam nem praticantes das ciências especiais nem analfabetos científicos. Estes "filósofos positivistas" seriam os guardiões de um novo dogma.

Comte não era ingênuo quanto ao status epistemológico do conhecimento científico, no entanto. Apesar da sua ênfase na indubitabilidade das descobertas científicas, ele admitia que elas podiam, no máximo, ser aproximações humanas. As leis naturais, escreveu ele, "o verdadeiro objeto da pesquisa [científica], não poderiam permanecer rigorosamente compatíveis com uma investigação detalhada demais".

O problema? Se as leis científicas são apenas aproximadas, os leigos podem perder a fé nelas. Assim, acreditava Comte, devem ser estabelecidos limites para a investigação científica. A "classe especial de homens" desestimularia as linhas e métodos de pesquisa que pudessem minar a certeza no conhecimento científico. Comte foi longe o suficiente para condenar o emergente cálculo de probabilidades por acreditar que o probabilismo encorajasse a ideia de que o conhecimento científico é apenas "provável".

Assim, os filósofos positivos foram os guardiões de uma “verdade escondida”, recapitulando a noção medieval de que a verdade revelada pela luz da razão natural deve permanecer oculta às massas cuja fé se fundamenta na escritura.

Os novos ateus podem não condenar o uso das probabilidades nem estabelecer limites para a pesquisa científica, mas promulgam, talvez sem se darem conta, a nobre mentira de que o conhecimento científico é inabalavelmente alicerçado em observações incontestáveis. Só assim a ciência poderia "roubar o poder da religião" 

Os potenciais perigos desse modo de interpretar a ciência são inúmeros. Mas o que a história do positivismo comteano revela é que a ciência, e não a religião, é quem mais tem a perder com isso.

A nova “religião da humanidade” sonhada por Comte não apenas não se concretizou: a sua nobre mentira teve o efeito oposto ao desejado. A ciência não conseguiu cumprir as promessas do positivismo no final do século XIX e as pessoas começaram a perder a fé no empreendimento científico.

Um historiador escreve: “Os que deificaram a ciência [...] tinham em comum o dogma fundamental de que a razão humana pode, através do ‘método científico’, vir a conhecer e a entender tudo [...] O positivismo abordou até mesmo problemas relacionados com as origens e os fins últimos, prometendo resultados demais, em especial nas áreas morais, sociais e religiosas [...] Mas o contraste entre as promessas e as limitadas realizações do cientificismo levou a uma forte reação antipositivista”.

O assim chamado debate sobre a "falência da ciência" permeou a cultura francesa e viu o confronto entre pensadores religiosos e ideólogos do cientificismo, entre céticos e racionalistas, ameaçando a hegemonia cultural de que a ciência tinha desfrutado durante boa parte do século.

Estamos hoje presenciando os nossos próprios debates sobre a "falência da ciência". Os pilares do empreendimento científico – a reprodutibilidade dos resultados experimentais e, mais recentemente e de forma destacada, o processo de revisão por pares – têm estado na berlinda, corroendo a credibilidade da ciência. E, como nos dias de Comte, esse debate não é questão acadêmica: tem implicações culturais, sociais e políticas mais amplas.

Os cientistas e os seus fanáticos têm razão ao criticar os céticos e os crentes religiosos que exploram as "lacunas" das teorias científicas, as falhas no consenso universal e a falta de evidências indiscutíveis. Ao agirem assim, estes céticos mantêm a ciência, de modo implícito, num patamar impossivelmente alto de certeza epistêmica. Mas o que os defensores da ciência muitas vezes não conseguem perceber é que são eles mesmos, e não os céticos, os primeiros a venderem esse alto patamar.

As razões são evidentes. A ideia de ciência indubitável é reconfortante não só por causa do – excepcionalmente alto – status epistêmico que ela confere à disciplina, mas também porque estabelece limites claros e incontestáveis entre ciência e "não-ciência". As noções não apenas religiosas "pseudocientíficas", podem ser firmemente descartadas: são "infantis", carentes de prova, irracionais e assim por diante. Na pior das hipóteses, os esquemas ideológicos e políticos podem ser justificados com base em fatos científicos supostamente incontestáveis. .

É difícil convencer o público leigo de que certas conclusões devem ser aceitas porque possuem alto grau de probabilidade e são válidas até que surja uma interpretação melhor dos dados que vão sendo descobertos. Seria mais fácil afirmar a descoberta de um fato incontroverso através apenas de meios de observação.

O problema é que a ciência não chega até os fatos incontroversos através apenas de meios de observação. Ela propõe teorias, modelos conceituais para explicar e interpretar dados empíricos, através de experimento, de inferência e – sim! – de imaginação e de especulação filosófica. Seja capaz ou não o público leigo de articular o que a ciência faz, é óbvio para muitos que as reivindicações exageradas feitas tantas vezes em nome da ciência não se sustentam.

O perigo de se inflar assim o estado da ciência é que as características comuns, neutras ou mesmo positivas da ciência (a sua atitude experimental, a sua abertura à refutação, a sua dependência de suposições extraempíricas, a interpenetração de observação e teoria e até mesmo a dificuldade de reproduzir experiências cruciais) se tornam lacunas, suposições a ser exploradas, razões para se abandonar a fé na ciência como tal.

Embora a influência de Comte permaneça, a geração de pensadores que se seguiu aos debates sobre a "falência da ciência" exibiu maior sofisticação na sua compreensão da ciência, produzindo alguns dos mais brilhantes cientistas, filósofos e historiadores da ciência do século XX. Talvez os detritos dos atuais debates sobre ciência e religião proporcionem um terreno similarmente fértil para que uma visão mais sofisticada e humanista da ciência se enraíze. Para começar, poderíamos acatar uma sugestão de Comte e examinar a nossa própria história.

O artigo original do site Aleteia poderá ser visto por meio desse link aqui:

http://www.aleteia.org/pt/sociedade/artigo/os-cientistas-se-tornaram-os-sacerdotes-de-uma-nova-religiao-dogmatica-5888803268984832

ARTIGOS ACERCA DE RICHARD DAWKINS, CHARLES DARWIN E OUTROS EVOLUCIONISTAS E ATEUS
















http://ograndedialogo.blogspot.com.br/2012/09/o-ateu-richard-dawkins-e-suas-grandes.html

Que Deus abençoa e todos.

Alexandros Meimaridis

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