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pelo site da Revista Carta Capital
Internacional
Opinião
O Hamas e seus 2
milhões de escudos humanos
Diante de
um adversário impiedoso, o Hamas utiliza uma tática que coloca em risco toda a
população da Faixa de Gaza
por José
Antonio Lima
Crianças
palestinas voltam para casa em Shejaiya, distrito de Gaza obliterado pelas
Forças Armadas israelenses. Segundo Israel, o local era usado pelo Hamas para
fabricar e estocar foguetes
O elevado
número de civis palestinos mortos na Operação Protective Edge (Borda Protetora)
tem feito Israel, e seus defensores, baterem repetidas vezes na tecla de que o
Hamas utiliza escudos humanos. O assunto é bastante controverso, mas a
realidade é que, a despeito de Israel estar realizando ataques
desproporcionais, a tática do Hamas de fato coloca toda a população da Faixa de
Gaza em perigo.
Na
quinta-feira 31, as Forças Armadas israelenses divulgaram dois vídeos
importantes. O primeiro, mostra imagens aparentemente captadas por drones do
que seriam 12 lançamentos de foguetes a partir de áreas civis na Faixa de Gaza.
O segundo
mostra a vistoria feita por soldados em uma mesquita destruída em combate. É
possível ver armas pesadas que, segundo os israelenses, estariam escondidas no
templo, também usado para acobertar entradas da rede de túneis utilizada pelo
Hamas.
Desde o
início da operação, a Unrwa, a agência da ONU para os refugiados palestinos,
encontrou foguetes em três de suas escolas, que estavam vazias. Em 29 de julho,
outro vídeo divulgado pelos militares israelenses mostrou o que seriam os
lançamentos de três foguetes a partir de uma escola em Gaza.
Em 25 de
julho, em análise sobre possíveis crimes de guerra cometidos por Israel e
Hamas, a Anistia Internacional lembrou que, em conflitos anteriores, a ONG
documentou o uso de instalações civis como depósito de armas e local de
lançamento de foguetes por parte de facções palestinas contra alvos civis
israelenses, o que é ilegal. Desta vez, sobre a questão do possível uso de
escudos humanos, há relatos, afirma a Anistia, de que o Hamas tem pedido para a
população permanecer em suas casas mesmo com os avisos de Israel, feitos por
telefonemas e por panfletos, sobre ataques iminentes em áreas civis. Para a
Anistia, isso não configura crime de guerra oficialmente, uma nomenclatura que
exigiria ordens diretas a civis para proteger instalações e equipamentos
militares. Com base nisso, repórteres da BBC e do
jornal The New York Times disseram não ter visto evidências de uso de escudos
humanos.
Israel
não tem dúvidas sobre a tática do Hamas. Para o governo israelense, o grupo
palestino usa este artifício com o objetivo de aumentar o número de vítimas
civis e fazer o Hamas ganhar a “guerra da propaganda”. “Nós pedimos para a população:
‘saiam’. Nós pedimos a eles de novo e de novo. Nós ligamos para eles, mandamos
mensagens de texto, damos panfletos. Nós pedimos que eles saiam, e alguns saem.
O Hamas diz: ‘não saiam, nós proibimos vocês’. Então o Hamas está usando essas
pessoas, esses civis, como escudos humanos”, disse Benjamin Netanyahu, o
premier israelense, em entrevista à BBC em 20 de julho.
Há duas
ponderações importantes sobre as acusações. A primeira é que a Faixa de Gaza é
um território minúsculo, de 11 quilômetros por 40 quilômetros, onde moram 1,8
milhão de pessoas. Quase todas as áreas são densamente povoadas, o que
dificultaria a separação entre áreas militares e civis mesmo que o Hamas
desejasse fazer essa distinção. As considerações sobre o tamanho da Faixa de
Gaza costumam irritar os israelenses, mas até a ex-secretária de Estado dos
Estados Unidos, Hillary Clinton, falou sobre isso em entrevista recente. A
segunda ponderação é mais importante. Como afirmou à CNN na semana passada
Hanan Ashrawi, da Organização para a Libertação da Palestina, o Hamas não é só
uma guerrilha, mas também um movimento islâmico responsável por escolas,
creches e hospitais. O Hamas é ainda um partido político, e também o governo da
Faixa de Gaza. Inúmeras instituições civis, assim, pertencem ao grupo. Se
Israel tem o Hamas como um todo como alvo, tem sob sua mira todas essas
instalações.
Mesmo
diante dessas observações e, da constatação de que o Hamas não está cometendo
um crime de guerra no rigor da lei, é óbvio que os atos do grupo militante
colocam em risco a população palestina.
Em 17 de
julho, reportagem do jornal The Washington Post revelou que o subterrâneo do
hospital Al-Shifa, o mais importante da cidade de Gaza, se tornou o “quartel
general dos líderes do Hamas, que podem ser vistos nos corredores e
escritórios”. O pouco destaque dado a essa informação na imprensa internacional
indignou publicações pró-Israel, como a revista judaica Tablet, que fez uma
longa reportagem detalhando como os jornalistas estrangeiros são ameaçados pelo
Hamas.
Há
evidências para corroborar a crítica. Na semana passada, o jornal francês
Libération tirou do ar uma reportagem no qual seu colaborador Radjaa Abou Dagga
descrevia como fora ameaçado por integrantes do Hamas. A alteração se deu a
pedido do jornalista, que tem familiares em Gaza. O jornal Algemeiner, judaico
como a Tablet, teve acesso ao relato de Dagga e conta que o jornalista foi
interrogado dentro do hospital Al-Shifa. Na terça-feira 29, o repórter italiano
Gabriele Barbati afirmou que os jornalistas estrangeiros em Gaza são mesmo
ameaçados pelo Hamas. Pelo Twitter, Barbati confirmou que um ataque na
segunda-feira 28 contra o campo de refugiados de Shati, na cidade de Gaza, que
matou nove crianças, foi fruto de um erro do Hamas, e não das forças israelenses.
O fato de
apenas publicações judaicas, como a Tablet e o Algemeiner, darem destaque para
as ameaças feitas pelo Hamas a jornalistas fortalece a tese, vigente em
círculos pró-Israel, de que o país é perseguido, e também a vitimização
utilizada pelo governo israelense para ganhar apoio interno. Lamentavelmente,
dá argumentos para quem busca deslegitimar o jornalismo que é feito na Faixa de
Gaza e, assim, defender as ações israelenses. O ápice desta prática foi o post
de David Bernstein no blog The Volokh Conspiracy, do Washington Post, com “40
perguntas para a mídia internacional“. Há pontos válidos, mas as perguntas
acabam por tentar tirar a credibilidade de todo o jornalismo feito na Faixa de
Gaza.
Como já dito,
as hostilidades atuais só tiveram início por conta de uma atuação deliberada do
governo Netanyahu. Uma vez iniciado o
conflito, no entanto, sua dinâmica deixa claro que Israel e o Hamas
compartilham um abominável desprezo pelas vidas de civis palestinos. O uso de
tanques de guerra e artilharia naval e aérea em áreas residenciais é crime de
guerra, pois viola o ponto da Convenção de Genebra que proíbe ataques
intencionais contra populações civis. Isso não absolve o Hamas, entretanto. O
grupo diz lutar pela liberação da Palestina e dos palestinos, mas suas ações
são imorais e eticamente condenáveis, pois nada mais fazem do que colocar os
habitantes da Faixa de Gaza sob risco. Essas quase 2 milhões de pessoas podem
não ser escudos humanos na letra fria da lei, mas o são de fato.
O artigo original do site da
Carta Capital poderá ser visto por meio desse link aqui:
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Alexandros Meimaridis
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