Conforme mencionamos no artigo
anterior, estamos publicando um segundo artigo acerca da bizarra cerimônia de
inauguração do Gothard Base Tunnel, que é o mais longo túnel ferroviário do
mundo, ligando a Suíça à Alemanha. O artigo é da autoria de Wilton Cardoso e
foi publicado no site do Professor Dr. Wilson Roberto Vieira Ferreira.
O bizarro show da abertura do
túnel suíço: sintoma da cultura do narcisismo
Wilson Roberto Vieira Ferreira
A bizarra e polêmica cerimônia de
inauguração do Gothard Base Tunnel (o maior túnel ferroviário do mundo ligando
Suíça à Alemanha) está rendendo comentários aqui no blog. O “Cinegnose”
interpretou o evento pelo viés do “Sincromisticismo” e do “ecumenismo
pós-moderno”. Nosso leitor Wilton Cardoso propôs mais uma interpretação, dessa
vez associando a um sintoma psíquico da atual sociedade de consumo: a chamada
“Cultura do Narcisismo”, tese do norte-americano Christopher Lasch – haveria
uma linha de continuidade entre o pastiche religioso-mítico-ocultista da
cerimônia do túnel suíço e o pastiche de produtos como “Harry Potter”, “Senhor
dos Anéis” etc.
Mais uma vez o nosso leitor
Wilton Cardoso oferece ao Cinegnose uma interessante contribuição ao propor uma
terceira interpretação para a bizarra cerimônia de inauguração do maior túnel
ferroviário do mundo, através da base dos Alpes, ligando Suíça à Alemanha: o
Gothard Base Tunnel.
Na postagem anterior descrevemos
a estranha cerimônia transmitida ao vivo para todo o continente (show teatral
multimídia inspirado em uma antiga lenda da cultura alpina suíça que envolve o
demônio) e as reações entre críticos e espectadores nas redes sociais - “satanismo”,
“ritual illuminati” foram as interpretações conspiracionistas mais lembradas —
ver artigo anterior por meio do link abaixo:
Tentando escapar deste
conspiracionismo simplista o Cinegnose propôs duas interpretações: evento
sincromístico e sintoma de uma espécie de ecumenismo pós-moderno que vem sendo
construído midiaticamente desde o início da globalização político-econômica nos
anos 1990.
Nosso leitor baseou sua
interpretação nas teses de um velho conhecido deste blog: o historiador e
crítico social norte-americano Christopher Lasch. Principalmente as teses sobre
a cultura do narcisismo, o mínimo eu e o “minimalismo”, sintomas culturais de
um mal estar bem diferente da época de Freud. Se na era vitoriana tínhamos a
neurose, hoje com o consumismo do capitalismo tardio temos o narcisismo e o
chamado “mínimo eu”.
Wilton Cardoso faz uma
interessante conexão entre as teses de Lasch, consumismo e o “ecumenismo
pós-moderno”. Leia abaixo:
*******
Creio que a peça expressa um dos
aspectos do consumismo do indivíduo contemporâneo. Consumismo que, por sua vez
é parte da personalidade narcisista deste indivíduo.
Em Cultura do Narcisismo,
Christopher Lasch (Editora Imago, 1983) mostra que a "patologia"
dominante do homem contemporâneo não é mais a neurose, como na época de Freud,
mas sim o narcisismo. A neurose resulta da repressão da libido nas sociedades
puritanas. O narcisismo, por outro lado, se exprime com desejo por aplauso
(fama) e culto ao prazer como alívio imediato às frustrações da sociedade
capitalista.
Um dos prazeres mais cultuados
pelo narcisista é o consumo, que proporciona a ilusão de poder e status aos que
podem ter/comprar. Não é preciso dizer que o narcisista-consumista é o
indivíduo ideal na sociedade da mercadoria, afinal, sua compulsão pelo consumo
faz o capital cumprir sua única função: se mover e multiplicar. O narcisista
vive para o capital, embora pense que se sirva dele para engrandecer seu ego.
Christopher Lasch e as
edições brasileiras de "Cultura do Narcisismo" e "O Mínimo
Eu"
Um aspecto pouco observado da
cultura do consumismo é o consumo simbólico (o ecumenismo pós-moderno), que
avança avidamente sobre todas as tradições dos povos anteriores ao capitalismo.
O consumo simbólico retira mitos, lendas, costumes, modas, comidas, crenças e
valores de seus significados originais, fundamentais para a reprodução social
de suas culturas, e os transforma em mercadorias etéreas, cuja função, como
qualquer mercadoria, é movimentar e expandir o capital.
Realizamos diariamente um
verdadeiro turismo espiritual por tradições mortas-revividas (será por isto que
o homem contemporâneo tem a sensação de ser um morto-vivo, zumbi?). Um exemplo
disso são a enormidade de filmes hollywoodianos sobre mitos, lendas, (super)
heróis e magia.
Mas, no final das contas, o
consumo simbólico vem de encontro a necessidades reais do homem contemporâneo,
pois a psique necessita de conferir sentido simbólico à vida. E o capitalismo é
incapaz de fornecer este sentido, de produzir, a partir de seu próprio solo,
conteúdos que deem sentido à vida humana. O capital é uma abstração, real, mas
vazia, cujo único sentido é se transformar em mais capital e cujas leis ignoram
totalmente as necessidades materiais e simbólicas da vida humana.
Então, resta apelar às criações
simbólicas de outras culturas, cujos sentidos são deturpados, ao serem
retiradas de seu contexto inicial e convertidas em mercadorias. Estas versões
distorcidas dos mitos apenas aliviam momentaneamente as frustrações do
indivíduo narcisista, pois são mercadorias e, como tais, não servem à vida
humana, mas apenas à reprodução do capital. O efeito, para além do alívio
imediato, é aumentar as frustrações e o sem sentido da vida na sociedade
capitalista.
O fato de todos estes mitos
convertidos em mercadorias parecerem extremamente infantis e imaturos (pensemos
no fenômeno cosplay, no Harry Potter, Senhor dos Anéis, parques temáticos, múmias,
vampiros etc.) está ligada à patologia do narcisismo, que fixa o homem na
primeira infância, cuja frágil psique está presa ao desejo de satisfação
imediata dos prazeres e à necessidade da aprovação incondicional (do aplauso)
dos pais.
O narcisista, o homem do
capitalismo tardio, é o indivíduo inseguro e fragmentado que quer compensar sua
fragilidade com prazer e aplauso, a todo custo.
O artigo original poderá ser
visto por meio do seguinte link:
NOSSO COMENTÁRIO
O narcisismo como citado acima é o elemento chave para entendermos o cruel processo por meio do qual as coisas são personificadas e as pessoas são coisificadas.
Que Deus tenha misericórdia de
todos.
Alexandros Meimaridis
PS.
Pedimos a todos os nossos leitores que puderem que “curtam” nossa página no
Facebook através do seguinte link:
Desde
já agradecemos a todos.
Os comentários não
representam a opinião do Blog O Grande Diálogo; a responsabilidade é do autor
da mensagem, sujeito à legislação brasileira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário