O fim do mundo é um tema
recorrente nas pregações de todas as religiões. A fé cristã também declara que
o mundo, como o conhecemos, terá um fim surpreendente quando do segundo
adventos do Senhor Jesus Cristo, o Deus da Glória. O apóstolo Pedro usou as
seguintes palavras para se referir a esse evento cataclísmico:
2 Pedro 3:10
Virá, entretanto, como
ladrão, o Dia do Senhor, no qual os céus passarão com estrepitoso estrondo, e
os elementos se desfarão abrasados; também a terra e as obras que nela existem
serão atingidas.
Dentro desse contexto, hoje
queremos repercutir um artigo da autoria do Prof. Dr. Wilson Roberto Ferreira
Costa com o propósito de enriquecer o debate sobre o tema.
Por
que o mundo tem que acabar?
Por Wilson Roberto Vieira
Ferreira
Diariamente o mundo acaba diante
dos nossos olhos, seja no cinema na atual safra de filmes-catástrofe, em séries
de TV sobre Nostradamus, previsões “científicas” de algum tipo de futura
catástrofe ambiental ou em algum “hoax” descrevendo cometas, asteroides ou
planetas errantes que cairão sobre a Terra. A última foi sobre um pedaço do
Planeta X que supostamente cairia no último dia 16. Por que o mundo tem que ser
destruído? No passado, todas religiões possuíam uma Escatologia: alguma
narrativa sobre o fim dos tempos onde os maus seriam punidos e os bons salvos.
Mas essas religiões se tornaram “líquidas”: sob os escombros das antigas
religiões salvacionistas viraram pastiches que se rendem ao utilitarismo das
necessidades do presente: “teologia da prosperidade”, “cabala do dinheiro” ou o
islamismo dos homens-bomba. Esqueceram-se do futuro. Por isso, essa nova
religião “líquida” e ecumênica precisa criar uma nova Escatologia, uma
narrativa midiática sobre o “fim dos tempos” que junte convicções
eco-ambientais, geofísica e astrofísica. A “Neoapocalíptica” como estratégia de
marketing.
Se o leitor estiver lendo as mal
traçadas linhas desse humilde blogueiro é porque, mais uma vez, o mundo não
acabou. Segundo um autoproclamado astrônomo russo, Dr. Dyomin Zakharovich, um
pedaço do Planeta X (ou “Nibiru”) atingiria a Terra o último dia 16/2.
Repercutido pela mídia, com toques conspiratórios sobre um suposto acobertamento
dos dados pela NASA, o dia chegou e nada aconteceu.
Mas agora um respeitado astrônomo
britânico, Lord Martin Rees, fala em “asteroide do Juízo Final” e alerta para a
necessidade da criação de um sistema de defesa global.
Sem falar no Planeta Nibiru (ou
“Planeta X”, “Hercólubus”, “Nêmesis” etc.), planeta com a massa de Júpiter, que
passaria pelo Sistema Solar perturbando todas ar órbitas planetárias e jogando
a Terra numa catástrofe cósmica. Turbinado pela profecia Maia em 2012, previam
que o planeta gigante passaria perto de nós naquele ano.
Agora, a sua passagem é prevista
para outubro desse ano, como afirma David Mead no livro Planeta X: A Chegada de
2017. Como previsto, com mais acusações conspiratórias de que a NASA sabe de
tudo, mas esconde do público para que apenas a elite mundial se salve em
bunkers subterrâneos construídos nesse momento.
Previsões apocalípticas não estão
apenas na Deep Web ou sites, revistas e tabloides sensacionalistas, aquelas
publicações que faziam a alegria do agente Kevin (MIB: Homens de Preto) que
acreditava que esses veículos eram a melhor fonte de informações da agência
governamental.
São também repercutidas em
portais de notícias da grande mídia, como “fatos diversos” ou “matérias frias”.
1999: o ano divisor de
águas
E nos canais fechados como
History Channel, National Geographic ou Discovery há uma profusão de séries com
uma gama de variações sobre o tema: hipótese para a extinção dos dinossauros, o
que aconteceria com as cidades vazias se a humanidade desaparecesse,
asteroides, efeito estufa, tsunamis, derretimento das calotas polares,
aquecimento global, pandemias e... as indefectíveis profecias de Nostradamus,
sempre com novas interpretações.
O ano de 1999 foi uma espécie de
divisor de águas nas profecias sobre o fim do mundo. Naquele ano a chegada do
novo milênio foi marcada pela confluência das profecias de Nostradamus e do
“bug do milênio” – a contagem anual em dois dígitos criaria um caos informático
nas redes de computadores na virada para o ano 2000, gerando desordem econômica
e social semelhante ao final da primeira temporada da série Mr. Robot – ver
mais por meio desse link aqui:
Por que um divisor de águas? Se
olharmos em perspectiva os diversos apocalipses previstos para a humanidade,
antes de 1999 a grande maioria girava em torno de interpretações de textos
bíblico como a chegada de Jesus para os adventistas em 1843 ou para os mórmons
em 1891.
Ou ainda por pastores televisivos
como Pat Robertson nos EUA que previu para 1982 um “julgamento no mundo” pelo
próprio Deus.
Em outras palavras, o fim do
mundo tinha uma natureza escatológica.
Pat Robertson: o modelo
escatológico de apocalipse
O estudo sobre o fim
A Escatologia é uma parte da
Teologia e da Filosofia. Significa “último” mais o sufixo “logia”, podendo ser
definido como “estudo sobre o fim”. Pretende tratar sobre os últimos eventos da
história do mundo ou do destino final do gênero humano.
Conceito criado no século XVII
pelo teólogo A. Calov, o conceito “Escatologia” vai expressar os pontos
centrais de muitos sistemas religiosos do passado (fim dos séculos,
ressurreição, juízo final etc.) e tensões não resolvidas dentro da Filosofia
como a tensão entre o destino individual e o coletivo ou o destino do humano e
o do universo como um todo.
As religiões monoteístas são
salvacionistas, isto é, colocam como condição para a salvação diante do fim dos
tempos a vida ortodoxa em conformidade com os ensinamentos do salvador.
Se a Teogonia é o componente das
religiões sobre as narrativas da Criação, a Escatologia será narrativa do
destino final do gênero humano.
Para o judaísmo teremos o “fim
dos dias” e posterior “era messiânica”. Os cristãos esperam o Apocalipse e o
Juízo Final fundamentado nas profecias do Apóstolo João. E o Islamismo está à
espera do chamado “décimo segundo Imam”. Para essas religiões salvacionistas é
necessário um evento apocalíptico, o juízo final, que puna os maus e salve os
bons que seguirem os preceitos para a salvação.
As religiões “líquidas”
É precisamente esse componente
moral da escatologia que entra em crise com a perda da legitimidade simbólica
dessas grandes religiões monoteístas, seja pelo materialismo da sociedade de
consumo, seja por escândalos diários repercutidos na mídia: o cristianismo
sempre associado aos escândalos da Igreja Católica repercutidos pela mídia
(pedofilia, corrupção etc.); o islamismo associado ao radicalismo, terrorismo e
intolerância; e o judaísmo associado aos crimes de guerra de Israel no
confronto com a causa palestina que repercute diariamente na mídia
internacional.
Desde o pós-guerra, sob os
escombros das teogonias e escatologias das grandes religiões monoteístas, há o
surgimento do misticismo de massas com a Astrologia e o que se convencionou
chamar de New Age – movimento espiritual buscando a fusão Oriente e Ocidente ao
mesclar autoajuda, psicologia motivacional, parapsicologia, esoterismo com
física quântica.
Parafraseando Zygmunt Bauman, as
religiões tornaram-se “líquidas”: mescla de fundamentalismo nostálgico com uma
colcha de retalhos que vai além do sincretismo religioso – rende-se ao
utilitarismo. Como, por exemplo, no católico que participa da missa dominical
em busca de paz e no meio da semana frequenta uma “mesa branca” em busca de
conselhos cotidianos.
Ou como as religiões evangélicas
se converteram em teologias da prosperidade, mais preocupadas com o sucesso no
presente do que com a vinda de Jesus no fim dos tempos.
Ou ainda como igrejas
neopentecostais juntam sessões de “descarrego” com a própria figura de Jesus
para a expiação do Mal ou dos “trabalhos feitos” que emperrariam a vida pessoal
do crente.
Essa liquefação dos grandes
sistemas religiosos do passado corresponde à própria liquidez da infraestrutura
econômico-financeira da ordem global – a liquidez ou a financeirização das
praças financeiras conectadas em tempo real.
A Neoapocalíptica
A Globalização necessita agora de
uma nova religião ecumênica que dê legitimidade às novas bases materiais. Uma
nova religião igualmente sem pátria, global, feita a partir do pastiche dos
escombros dos grandes sistemas religiosos.
Porém, há um problema: é
necessário construir uma nova Escatologia, a descrição de algum evento
apocalíptico futuro que tenha a mesma função moral das escatologias do passado:
redimir os bons e punir os maus. Para, no final, justificar a ordem existente
(seja política, econômica ou social) como condição necessária para alcançarmos
a salvação. A elaboração de uma “Neoapocalíptica”.
Uma nova Escatologia, agora
elaborada pelas narrativas de apocalipses sem a presença de Deus, Jesus ou
juízos finais: agora será um asteroide, um cometa, o aquecimento global, ou
alguma espécie de catástrofe cósmica.
Por assim dizer, uma “neoapocalíptica secularizada”.
Um bom exemplo desse imaginário
pode ser acompanhado no filme 50/50 (2011), uma comédia dramática no qual um
jovem descobre que está com câncer. Ao receber o diagnóstico, ele não se
conforma: “Por que? Não fumo, não bebo e reciclo o lixo todos os dias...”. Um
bom exemplo de como boas condutas ambientais têm na atualidade um componente
muito mais moral do que racional – no futuro, o aquecimento global (ou o
câncer) poderá destruir o planeta, mas a culpa não será minha...Estarei salvo
com a minha consciência.
Essa é a motivação por trás da
safra atual de filmes-catástrofes e na profusão se séries pseudocientíficas na
TV sobre futuras catástrofes ambientais, astronômicas ou releituras das
profecias de Nostradamus – agora o “Rei do Terror” descrito nas Centúrias é o
Planeta X...
Essa nova religião ecumênica da Globalização já possui uma Teogonia: o Big Bang da Cosmologia. Falta agora uma Escatologia plausível, uma neoapocalíptica que tente juntar convicções eco-ambientais com geofísica e astrofísica.
E a Nova Jerusalém depois do fim
dos tempos, a “Era Messiânica” do judaísmo, não será mais a cidade celestial,
mas a imortalidade no ciberespaço cujo hardware foi construído pelas mesmas
corporações que vendem o discurso do fim do mundo.
A Neoapocalíptica seria, afinal,
uma estratégia de marketing? A necessidade da destruição do mundo seria mais
uma estratégia de obsolescência planejada? Estratégia de venda de uma “Terra
2.0” unificada em torno das grandes corporações sem pátria, religião ou
ideologias?
O artigo original poderá ser
visto por meio do link abaixo:
Que Deus abençoe a todos.
Alexandros Meimaridis
PS.
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