Ecriba
Este estudo é parte de uma breve introdução ao Antigo Testamento. Nosso interesse é ajudar todos os leitores a apreciarem a rica herança que temos nas páginas da Antiga Aliança. No final de cada estudo o leitor encontrará direções para outras partes desse estudo.
INTRODUÇÃO AO ANTIGO TESTAMENTO - O
Que é o Antigo Testamento? — pARTE 3
IV. Transmissão Textual: Como a
Bíblia chegou até nós?
Graças ao trabalho de inúmeros indivíduos
fiéis ao longo de muitos séculos nós podemos ler a Bíblia hoje. Estes
indivíduos são tecnicamente chamados de escribas. Estes homens copiaram, à mão,
a Palavra de Deus, tomando grande cuidado para manter a exatidão daquilo que
copiavam.
A. O cuidado dos escribas com os
textos do Antigo Testamento.
1. Os escribas no mundo antigo.
Os escribas tiveram um papel
essencial no mundo antigo. A transmissão fiel de informações precisas era um
dos aspectos mais importante das sociedades da Antiguidade. Os reis contavam
com os escribas para registrar os editos reais. Oficiais administrativos
precisavam dos escribas para registrar transações importantes. Os erros podiam
ter implicações políticas, econômicas ou de outra natureza de grande seriedade.
Os escribas da antiguidade, que
copiavam os textos bíblicos criam que estavam copiando as palavras do próprio
Deus. Consequentemente, tomavam grande cuidado no intuito de preservar as
cópias que haviam recebido. Um dos mais importantes grupos de escribas foi o
dos Massoretas.
2. Os Massoretas
Os Massoretas — 500—1000 d.C —
trabalharam para preservar os textos do Antigo Testamento que haviam recebido.
Eles queriam assegurar um entendimento correto dos textos, bem como sua
transmissão com fidelidade, para as gerações futuras. Eles foram chamados de
Massoretas por causa da trosm - massora – tradição textual, desenvolvida por
estes homens, e que era um complexo sistema de símbolos que eles haviam
desenvolvido para ajudá-los a alcançar seus objetivos.
Os Massoretas seguiram três passos para garantir a precisão
textual:
a. Primeiro desenvolveram um sistema para escrever as vogais, já
que as línguas hebraica e aramaica são línguas consonantais, i.e., não possuem
vogais e todas as letras de seus alfabetos são consoantes. Mesmo sendo línguas
consonantais, no entanto, tanto o hebraico como o aramaico possuíam certas
consoantes que soavam como vogais. O que os Massoretas fizeram foi desenvolver
um sistema complexo de vogais - a, e, i,
o, u e vogais com sons mais abertos ou mais fechados - visando preservar,
na escrita, as tradições orais que haviam recebido das gerações anteriores.
b. Em segundo lugar, os Massoretas desenvolveram um sistema de
acentuação para o texto hebraico. Estes acentos ajudavam o leitor a pronunciar
o texto corretamente, mas, além disso, mostravam a relação entre várias
palavras e frases de uma mesma sentença. Dessa maneira eles ajudaram a
esclarecer diversas passagens difíceis.
c. Em terceiro lugar, os Massoretas desenvolveram um sistema de
anotações detalhadas do texto. Estas anotações ofereciam um meio pelo qual era
possível verificar a precisão do texto copiado. Nos dias de hoje podemos
produzir cópias de documentos idênticas usando em computador ou uma máquina
copiadora. Os Massoretas tinham que fazer tudo à mão.
A palavra
hebraica usada para “escriba” significa literalmente “contador” e isto porque
os escribas contavam, absolutamente tudo, no texto. Eles sabiam, por exemplo,
que a תּוֹרָה – torah – instrução ou os primeiros cinco livros do
Antigo Testamento - continha 400.945 palavras! Eles também nos informam que o
versículo de Levítico 8:8 representa o exato meio da תּוֹרָה – torah - instrução. Eles sabiam que a palavra que ficava
exatamente no meio da תּוֹרָה – torah - instrução era a palavra “buscou” em Levítico
10:16. Sabiam também que a letra que ficava exatamente no meio da תּוֹרָה– torah - instrução era uma das letras da
palavra traduzida por “ventre” em Levítico 11:42. Estas informações podem
parecer apenas curiosas, mas para os Massoretas essas eram informações vitais
para a preservação cuidadosa da Palavra de Deus. Devemos ser gratos a Deus pela
dedicação destes homens, que através dos séculos se empenharam para preservar
incorrupta a Palavra de Deus.
B. A transmissão nas línguas
Originais - Hebraico e Aramaico.
A maior parte do texto do Antigo
Testamento foi escrita originalmente em hebraico.
Pequenas porções que podem ser encontradas em Gênesis 31:47b; Esdras 4:8— 6:18;
7:12—16; Jeremias 10:11b e Daniel 2:4b—7:28, foram escritas em aramaico. Tanto o hebraico quanto o
aramaico são línguas semíticas que pertencem à mesma família do acádio — que era a língua falada pelos
Sírios, Assírios e pelos Babilônios — do amorita,
do fenício, do ugarítico,do amonita, do
moabita e do árabe.
Várias cópias em hebraico, do
Antigo Testamento, chegaram até nossos dias. Três destas cópias são de maior
importância para os nossos estudos. Esses são: O Texto Massorético, o Pentateuco
Samaritano, e os Manuscritos do Mar
Morto.
1. O texto Massorético.
A expressão “Texto Massorético” –
TM - refere-se a um grupo de
manuscritos hebraicos do Antigo Testamento, datados desde os primeiros séculos
da Idade Média, e que são todos concordes entre si. Estes manuscritos possuem
um padrão elevado de uniformidade textual, devido ao trabalho coerente e
meticuloso dos escribas judeus do período medieval, conhecidos como Massoretas,
que adotaram um rígido sistema para preservar, o texto da Bíblia Hebraica, sem
corrupções e sem alterações significativas.
Hoje em dia, todas as edições
impressas da Bíblia Hebraica, bem como todas as traduções modernas -
incluindo-se ai a nossa versão de Almeida Revista e Atualizada – ARA - são
baseadas no TM. A estrutura
consonantal do TM remonta ao período do Segundo Templo — c. 450 a.C. a 70 d.C.
Após a destruição do Templo e da cidade de Jerusalém, os judeus se reuniram na
cidade de Jâmnia para resolver a situação canônica de certos livros do Antigo
Testamento que ainda tinham sua autoridade disputada. Deste concílio surgiu um
texto que foi recebido pelos judeus como oficial. Este concílio, em Jâmnia,
aconteceu perto do final do primeiro século e, desde 100 d.C., todas as
comunidade judaicas adotaram-no como a forma textual definitiva e oficial das
Escrituras Sagradas para os judeus. O texto bíblico do Antigo Testamento, tanto
de judeus quanto de cristãos, baseia-se no TM
estabelecido há muitos séculos pelos escribas na época antiga e, mais tarde,
pelos Massoretas, durante o período medieval.
O texto atual da Bíblia Hebraica
passou por um processo de definição textual desde os primeiros séculos do
período medieval, quando os Massoretas procuravam padronizar, uniformizar e
transmitir, para as futuras gerações de escribas, um texto que fosse correto e
livre de corrupções textuais. Os manuscritos do TM conhecidos hoje em dia apresentam um número reduzido de
variantes e que são, em sua totalidade, insignificantes. O texto bíblico
preparado pela atividade massorética, e que é a base de todas as edições
modernas da Bíblia, é exatamente o mesmo há mais de 1000 anos, desde que os
primeiros Massoretas surgiram por volta do século VII.
O tipo textual do TM possui muitas testemunhas antigas
que atestam sua antiguidade e seu uso pelos judeus e pelos primeiros cristãos.
Essas testemunhas incluem: os targumim — comentários acerca de passagens
bíblicas; a Peshita — tradução das Escrituras para o Siríaco antigo ou Aramaico;
as traduções gregas de Áquila, de Símaco e de Teodocião; as recensões[1] da LXX feitas por Luciano e por Orígenes; a Vulgata Latina e os vários
manuscritos encontrados no deserto da Judéia, e que são conhecidos como
Manuscritos do Mar Morto, descobertos a partir de 1947 em Khirbet ou ruínas de
Qumran, Wadi Murabba’at, Nahal Hever e Massada. A tudo isto, nós devemos somar as
milhares de citações rabínicas antigas e medievais, que também refletem o texto
do TM.
A partir de 1450 d. C. com o
surgimento da imprensa inventada por Johannes Gutenberg[2],
o TM vem sendo impresso de forma
contínua, por editores tanto cristãos como por judeus. Todas as primeiras
edições críticas da Bíblia Hebraica — edições que discutem leituras variantes
em um mesmo texto — surgidas desde o século XVIII, assim como as edições de
Benjamin Kennicott (1776—1780) de Giovanni Bernardo Rossi (1784—1788), e a de
Christian David Ginsburg (1908—1926), baseiam-se na forma textual estabelecida
e transmitida pelos escribas e Massoretas.
Além das edições mencionadas
acima, atualmente, existem outras cinco versões, que seguem determinados
manuscritos massoréticos pertencentes ao período do auge da atividade massorética.
Entre estas podemos citar:
- Bíblia Hebraica Kittel – símbolo = BHK.
- Bíblia Hebraica Stuttgartensia – símbolo = BHS.
- Bíblia Hebraica Leningradensia – símbolo = BHL.
- Bíblia Hebraica Quinta – símbolo BHQ. Esta versão está sendo editada atualmente pelas Sociedades Bíblicas Unidas e está prevista, para ser publicada completa, em 2020. Enquanto a mesma vem sendo publicada em fascículos. Esta versão deverá suceder a Bíblia Hebraica Stuttgartensia – BHS.
- Bíblia Hebraica do Hebrew University Bible Project – símbolo = HUBP[3].
As três primeiras Bíblias Hebraicas
mencionadas acima, estão todas baseadas no Códice[4]
de Leningrado, chamado: B 19a (L). E
a última, da lista acima, está baseada no Códice de Aleppo chamado de Códice A.
O Códice de Leningrado B 19a - designado pela letra L - foi produzido em 1008 d.C.
Estudiosos acreditam que o mesmo tenha sido copiado de um manuscrito produzido
por Aaron ben Moseh ben Asher. Este manuscrito contém todo o Antigo Testamento.
O Códice de Aleppo - designado
pela letra A - foi produzido por
volta do ano 940 a.D. Foi originalmente encontrado em Jerusalém e de lá, levado
para a cidade do Cairo no Egito. Do Cairo foi levado para Aleppo, no norte da
Síria. É desta cidade que o manuscrito toma emprestado seu nome. Maimônides[5] costumava referir-se a este
código, como o mais fidedigno - digno de fé; merecedor de crédito - de todos os
que ele conhecia. Originalmente, o Códice A,
continha o Antigo Testamento inteiro em 380 fólios – folhas escritas na frente
e no verso - mas uma turba invadiu a sinagoga sefardita[6]
em 1498, e no processo, mais ou menos um terço do manuscrito foi destruído,
restando somente 294 fólios, atualmente. Depois da destruição o manuscrito
começa com a última palavra de Deuteronômio 28:17 itravmw – (vu)misheadeteka – tua
amassadeira Este manuscrito encontra-se,
atualmente, na Universidade de Jerusalém sob os cuidados do Instituto Ben Zvi.
OUTROS ESTUDOS DESSA SÉRIE PODEM SER ENCONTRADOS NOS LINKS ABAIXO:
001 – O CÂNON DO ANTIGO TESTAMENTO
002 – A INSPIRAÇÃO DA BÍBLIA
003 – A TRANSMISSÃO TEXTUAL DA BÍBLIA — Parte 1 = Os
Escribas e O Texto Massorético — TM
004 – A TRANSMISSÃO TEXTUAL DA BÍBLIA — Parte 2 = O Texto
Protomassorético e o Pentateuco Samaritano
005 – A TRANSMISSÃO TEXTUAL DA BÍBLIA — Parte 3 = Os
Manuscritos do Mar Morto e os Fragmentos da Guenizá do Cairo
http://ograndedialogo.blogspot.com.br/2012/09/a-transmissao-do-texto-da-biblia-parte-3.html
006 - A TRANSMISSÃO TEXTUAL DA BÍBLIA — Parte 4 = A
Septuaginta ou LXX
007 - A TRANSMISSÃO TEXTUAL DA BÍBLIA — Parte 5 = Os Targuns
e Como Interpretar a Bíblia
Que Deus abençoe a todos.
Alexandros Meimaridis
Parte do material contido neste estudo foi adaptado e editado das
seguintes obras, que o autor recomenda para todos os interessados em aprofundar
os conhecimentos acerca do Antigo Testamento:
Bibliografia
Arnold, Bill T. e Beyer, Bryan E. Descobrindo o Antigo Testamento. Editora Cultura Cristã, São Paulo, 2001.
Confort, Philip Wesley (Editor). A Origem da Bíblia. Casa Publicadora das
Assembléias de Deus, Rio de Janeiro, 4ª Edição, 2003.
Champlin, R. N, editor. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia.
Editora Hagnos, São Paulo, SP.
Francisco, Edson de Faria. Manual da Bíblia Hebraica – Introdução ao
Texto Massorético. Sociedade Religiosa Edições Vida Nova, São Paulo, 1ª
Edição, 2003.
Geisler, Norman e Nix, William. Introdução Bíblica – Como a Bíblia chegou
até nós. Editora Vida, São Paulo, 2ª Impressão, 1977.
Walton, John H. Chronological Charts of The Old Testament. The Zondervan
Corporation, Grand Rapids, 1978.
Würthwein, Ernst. The Text of the Old Testament. William B. Eerdmans Publishing
Company, Grand Rapids, Reprinted, 1992.
Enciclopédias
__________The
New Encyclopaedia Britannica. Encyclopaedia Britannica Inc., Chicago, 15th
Edition, 1995.
PS. Pedimos a todos os nossos leitores que puderem que “curtam” nossa
página no facebook através do seguinte link:
Desde já agradecemos a todos.
[1] Recensões: 1) Recenseamento e, 2)
Cotejamento do texto de uma edição com o respectivo manuscrito.
[2] Johann Gensfleisch Zum Laden
Zum Gutemberg, artesão alemão nascido no século XIV em Mainz na Alemanha, veio
a falecer, provavelmente, em 3 de Fevereiro 1468 também em Mainz. Gutemberg foi
o responsável pela invenção da imprensa moderna, mediante a utilização de tipos
móveis esculpidos em madeira e revestidos de metal e tinta à base de óleo. Sua
invenção foi única, e sua técnica não era conhecida nem na China, nem na Coréia
do século XV. Até nos dias de hoje, podemos ver pequenas gráficas, usando a
tecnologia inventada por Gutenberg.
[3] Este projeto publicou, até o
ano de 2003, somente os livros do profeta Isaías — entre 1975 e 1995 — e do
profeta Jeremias — 1997. Nestas edições, em seus aparatos críticos, são citadas
várias fontes judaicas antigas e medievais, bem como a LXX, os manuscritos do Mar Morto, outros manuscritos massoréticos,
a literatura talmúdica e a literatura rabínica medieval.
[4] Chamam-se de “Códice” os manuscritos
antigos montados em forma de “livros” modernos utilizando “cadernos” de oito,
dez ou doze folhas. A forma alternativa aos códices eram os rolos de papiro ou
mesmo de pergaminho — couro de ovelhas, cabras, veados, etc ou vellum — couro
de bois.
[5] Moses Maimônides rabino judeu
nascido em 30 de Março de 1135 a.D. em Córdoba na Espanha e falecido em 13 de
Dezembro de 1204 no Egito.
[6] Do
hebraico tardio “sepharadh”, naturais de Sepharadh, provável região da Ásia
Menor e que, posteriormente, os emigrantes asiáticos, identificaram com a
Península Ibérica. Chamam-se de sefarditas os judeus descendentes dos primeiros
israelitas de Portugal e da Espanha, expulsos, respectivamente, em 1496 e 1492.
São também chamados de sefaraditas. Na sEspanha eram chamados de Marranos ou
porcos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário