Ministérios da Igreja
CONTINUAÇÃO
II –
Igrejas — Corporativas e Institucionais
Em segundo lugar, nossa incapacidade tem a ver com a
institucionalização e o corporativismo das nossas igrejas denominacionais. Como
nossas “matrizes” estrangeiras nós estamos muito próximos do abismo que
confunde respeitabilidade com espiritualidade. Chegamos a um ponto em que já
não somos mais cidadãos de segunda classe, quando comparados à igreja Católica
Romana. O próprio “mercado” já nos reconhece como um alvo a ser atingido. Mas
certamente estamos muito longe de sermos ou de continuarmos a ser dignos
descendentes e representantes da verdadeira igreja. Ricardo Gouvêa resumiu de
forma brilhante o quadro atual ao dizer: “o
protestantismo tornou-se hoje uma tradição religiosa pesada, clericalizada,
institucionalizada, sistematizada, e o ensino da palavra de Deus acaba muitas
vezes perdido sob o entulho dos anos de reflexão escolástica, do ensino
pragmático, do sensorialismo tolo, da pseudo-ortodoxia desespiritualizada e da
prática ritualista. Hoje o protestantismo tornou-se tão tradicionalista quanto a
igreja católica, e às vezes ouço alguém comentar que é quase como se fosse
necessária uma nova reforma protestante.”[1]
Sim, é necessário uma nova reforma.
O leitor não precisa ir muito longe para constatar o
que está escrito aqui. Uma leitura, mesmo superficial, de qualquer constituição
ou estatuto de qualquer igreja, poderá facilmente constatar o corporativismo ali
presente. Todas elas são escritas com o objetivo primário de proteger os
interesses da classe dominante. A atitude demonstrada por Jesus ao lavar os pés
dos discípulos não tem nenhum valor na cristandade do século XXI. Em vez de
seguir o exemplo de Jesus —
João 13:13—15
13 Vós me
chamais Mestre e Senhor e dizeis bem, porque eu o sou.
14 Ora, se
eu, Senhor e Mestre, vos lavei os pés, vós deveis também lavar os pés uns aos
outros.
15 Porque
eu vos dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também.
nossos líderes religiosos, se parecem mais com o
personagem Sacripante, pessoa de índole
violenta, mau caráter e falsamente piedosa, do poema Orlando Innamorato,
de Matteo-Maria Boiardo (1434-1494), e do poema Orlando Furioso, de Luigi
Ariosto (1474-1533).
Olhe ao seu redor, não importa a que denominação você
pertence e responda: os líderes da sua denominação estão servindo os irmãos — fazendo
os serviços mais insignificantes como lavar os pés —, ou estão se servindo dos
irmãos? Estão nossos líderes seguindo o ensino de Jesus quando ele disse:
Marcos
10:42 - 44
Sabeis que
os que são considerados governadores dos povos têm-nos sob seu domínio, e sobre
eles os seus maiorais exercem autoridade. Mas entre vós não é assim; pelo
contrário, quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva; e
quem quiser ser o primeiro entre vós será servo de todos .
Não creio que estejamos vendo esta qualidade de
serviço. Nossas lideranças se parecem muito mais com aqueles que buscavam os primeiros
lugares nos banquetes e nas sinagogas. Note como se congratulam e como sempre
convidam seus pares para estarem junto nas plataformas. Como fazem questão dos
títulos de “pastor”, “reverendo”, “ancião” etc. Como se veem distintos dos
irmãos. Esses pequenos, mas emblemáticos sinais demonstram de maneira clara que
não estão seguindo o exemplo de Jesus. A falta da genuína fraternidade é a
prova mais contundente do fracasso absoluto da cristandade.
III –
Educação Cristã Padronizada — Programas X Pessoas
Nada ressalta de maneira mais absoluta nossa
incapacidade do que nossa abordagem da educação cristã e dos ministérios da
igreja. Na maioria das nossas igrejas um planejamento dos ministérios
educacionais da igreja é completamente inexistente. Não se pensa nada de novo.
Ao se iniciar um trabalho, se importam os formatos já conhecidos —quase tudo
que está disponível nos dias de hoje é diretamente importado das terras do tio
Sam — e utilizados nas igrejas de origem. Os modelos importados,[2]
não entendem que as necessidades dos ribeirinhos da Amazônia são muito
diferentes das necessidades dos gaúchos que vivem na fronteira com o Uruguai.
De acordo com Eugene Peterson “a
espiritualidade e o ministério são sempre locais e específicos, e acontecem sob
condições específicas para cada caso”.[3]
Ademais, não existe a formação de pessoas nas igrejas
locais para administrarem e ministrarem às mais diversas necessidades. Isto se
deve, diretamente, à incapacidade dos nossos pastores, já que é competência dos
mesmos o “aperfeiçoamento dos santos visando o
desempenho do seu serviço para a edificação do corpo de Cristo — Efésios 4:12”. Mas isto não lhes foi
ensinado no seminário, e muito menos lhes foram fornecidas as ferramentas para
se atingir tais objetivos. Nossos pastores refletem a imagem dos seus mestres.
São vaidosos e se consideram distintos dos irmãos que compõe o rebanho, não
apenas no aspecto funcional — reconhecido pelas escrituras pois temos funções
diferentes dentro do corpo de Cristo, a igreja — mas também posicional — desconhecido
das escrituras já que todos nós, independente da função, estamos posicionados
“em Cristo.
Tudo isto nos leva a uma educação cristã padronizada
onde os programas são mais importantes que as pessoas, já que são, na maior
parte das vezes, impostos de cima para baixo. A vaidade humana tem total
supremacia sobre as necessidades das pessoas. Tudo começa com a incapacidade
que temos de determinar quais são as necessidades das pessoas às quais
pretendemos ministrar. Não conhecendo as necessidades nada podemos fazer para
satisfazê-las. Não admira que estejamos perdendo desde crianças até adultos da
terceira idade.
Nossos programas padronizados não levam em conta que
cada grupo — crianças, adolescentes, jovens, adultos solteiros, adultos casados
sem filhos, adultos casados com filhos, pessoas de meia e da terceira idade e
isto para não falar nas mães solteiras, viúvas, órfãos, pessoas separadas ou
divorciadas e etc., têm suas próprias características e necessidades e anseiam
por ter suas necessidades individuais satisfeitas. Sem conhecer as necessidades
não conseguimos estabelecer os alvos certos. Ou seja, estamos atirando a esmo, sem
chances reais de acertar os alvos corretos. Sem os alvos apropriados, não
importa os programas e pouco importam os métodos e os materiais utilizados e
são totalmente irrelevantes, os métodos de organização e administração, que
possamos ter. Os mesmos não atingirão o alvo certo e jamais satisfarão as
necessidades reais das pessoas. A apatia enfrentada pelas denominações tradicionais
tem um diagnóstico preciso: não
estamos satisfazendo as necessidades das pessoas.
No outro lado da moeda isso também explica o porque
do grande sucesso das novas igrejas, como as que mencionamos em outro artigo da
série. Em um país miserável e de miseráveis, em um país de desempregados, em um
país onde a insegurança é palpável, em um país onde o sistema de medicina do
estado e o sistema previdenciário encontram-se em completa falência faz muito
sentido oferecer soluções mágicas para a falta de dinheiro ou bens, a falta de
emprego, de saúde e de segurança. As técnicas de embromação se multiplicam tão
ou mais velozmente do que a multiplicação do desespero das pessoas. Desta maneira,
essas formas de religiões pseudocristãs, apesar de condenarem de maneira
veemente as religiões afro-brasileiras, o espiritismo e a idolatria patrocinada
pela igreja Romana, acabam por oferecer soluções mágicas e imediatas iguais
àquelas das formas religiosas que condenam. A confusão é imensa. Mas será que
está tudo perdido? Não, se pensasse assim não estaria aqui escrevendo estas
linhas e desejando compartilhar uma forma de retornarmos ao ponto onde as
pessoas voltem a ser nossa prioridade número um. Somente quando entendermos
qual é o propósito distinto e singular de Deus para nossos dias, e que este
propósito de Deus tem tudo a ver com pessoas, poderemos então iniciar uma
caminhada no sentido de reconstruir a igreja, ou como já foi mencionado
anteriormente efetuarmos uma nova reforma.
CONTINUA...
OUTROS ESTUDOS ACERCA DE EDUCAÇÃO CRISTÃ
001 — A EXCELÊNCIA DA VIDA PESSOAL DAQUELES QUE DESEJAM ENSINAR — PARTE 001
002 — A EXCELÊNCIA DA VIDA PESSOAL DAQUELES QUE DESEJAM ENSINAR — PARTE 002
003 —A EXCELÊNCIA DA VIDA PESSOAL DAQUELES QUE DESEJAM ENSINAR — PARTE 003
004 — A IMPORTÂNCIA DA ALIANÇA COM DEUS
005 — OS ALVOS DA EDUCAÇÃO CRISTÃ
006 — A IGREJA NO PRINCÍPIO DO SÉCULO XXI – PARTE 001 — INTRODUÇÃO — OS COLONIZADORES VÊM EM NOME DE DEUS
007 — A IGREJA NO PRINCÍPIO DO SÉCULO XXI – PARTE 002 — NOSSAS ESCOLAS TEOLÓGICAS
008 — A IGREJA NO PRINCÍPIO DO SÉCULO XXI – PARTE 003 — IGREJAS CORPORATIVISTAS E INSTITUCIONALIZADAS E EDUCAÇÃO CRISTÃ PADRONIZADA
009 — A IGREJA NO PRINCÍPIO DO SÉCULO XXI – PARTE 004 — CONSUMISMO E CELEBRITISMO
010 — O PROPÓSITO SINGULAR DE DEUS PARA OS NOSSOS DIAS
011 — A PALAVRA IGREJA NO NOVO TESTAMENTO
012 — A EXPRESSÃO GREGA “EM CRISTO” — ἐν Χριστῷ
013 — O ENSINO DO NOVO TESTAMENTO ACERCA DA IGREJA
014 — O ENSINO DO NOVO TESTAMENTO ACERCA DA IGREJA — Parte 002
015 — O ENSINO DO NOVO TESTAMENTO ACERCA DA IGREJA — Parte 003
http://ograndedialogo.blogspot.com.br/2016/09/educacao-crista-estudo-015-o-que-o-novo.html
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016 — O ENSINO DO NOVO TESTAMENTO ACERCA DA IGREJA — Parte 004 — A IGREJA COMO PLENITUDE
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017 — O ENSINO DO NOVO TESTAMENTO ACERCA DA IGREJA — Parte 005 — A UNIDADE DA IGREJA CRISTÃ
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018 — O ENSINO DO NOVO TESTAMENTO ACERCA DA IGREJA — Parte 006 — HUMILDADE E AMOR EM MEIO À DIVERSIDADE DE DONS
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019 — O ENSINO DO NOVO TESTAMENTO ACERCA DA IGREJA — Parte 007 — A IGREJA COMO MISTÉRIO DE DEUS
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020 — O ENSINO DO NOVO TESTAMENTO ACERCA DA IGREJA — Parte 008 — COMO A IGREJA É FORMADA OU CRIADA?
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021 — O ENSINO DO NOVO TESTAMENTO ACERCA DA IGREJA — PARTE 009 — QUANDO A IGREJA COMEÇOU?
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http://ograndedialogo.blogspot.com.br/2017/03/educacao-crista-estudo-021-o-que-o-novo.html
Alexandros Meimaridis
PS. Pedimos a todos os nossos leitores que
puderem que “curtam” nossa página no Facebook através do seguinte link:
Desde já agradecemos a todos.
[1] Ricardo Quadros Gouvêa na
introdução do livro de Emil Brunner O
Equívoco sobre a Igreja, São Paulo, Editora Novo Século Ltda, 2000.
[2] Talvez os casos mais
clamorosos sejam os representados por Rick Warren e seu livro “Uma Igreja com
Propósitos” — recomendado pelo já falecido Pastor Ary Velloso como sendo “o
melhor, mais prático e o mais rico ensino sobre o crescimento da igreja depois
do livro de Atos dos Apóstolos — e por Cezar Castellanos e seu livro “Sonha e
Ganharás o Mundo” — recomendado pela pastora e missionária Valnice Milhomens.
Estes dois livros representam modelos de evangelização que disputam os corações
dos pastores brasileiros. Um é originário da Califórnia nos Estados Unidos e o
outro nos chega diretamente de Bogotá na Colômbia.
[3] Peterson, Eugene, O Pastor Desnecessário, Rio de Janeiro,
Editora Textus, 2001.
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