Essa é uma série cujo
propósito é estudar, com profundidade, os ensinamentos da Bíblia acerca do
pecado, com uma ênfase especial na questão do chamado “pecado para a morte”. Os
demais estudos dessa série poderão ser acessados por meio dos links alistados
no final desse estudo.
14B. Pecado Para a
Morte — PARTE B
1 – Interpretações Centradas em Diferentes
Tipos de Penas ou Castigos.
Este grupo
concentra todas as interpretações que enfatizam a presença ou ausência da pena
de morte ou da morte em si como uma consequência inevitável do pecado cometido.
O “pecado para a morte” pode levar à morte natural do indivíduo seja ela
imposta pela comunidade ou por visitação divina. Em
Números 18:22
E nunca mais os filhos de Israel
se chegarão à tenda da congregação, para que não levem sobre si o pecado e
morram.
Deus proíbe
que os Israelitas se aproximem da tenda da congregação para que não cometam um
pecado “para a morte” ou pecado que conduziria à morte do transgressor.
Deuteronômio 22:25—26
25 Porém, se algum homem no campo
achar moça desposada, e a forçar, e se deitar com ela, então, morrerá só o homem
que se deitou com ela;
26 à moça não farás nada; ela não
tem culpa de morte, porque, como o homem que se levanta contra o seu próximo e
lhe tira a vida, assim também é este caso.
faz uma
distinção entre o estuprador e sua vítima. Ele deveria ser morto, mas ela “não
tem culpa de morte”.
Dentre as
pessoas que defendem as interpretações centradas em diferentes tipos de
pecados, existe um grupo de estudiosos que entendem a idéia do pecado para
morte referida por João, como sendo o pecado descrito em
Levítico 20:11
O homem que se deitar com a
mulher de seu pai terá descoberto a nudez de seu pai; ambos serão mortos; o seu
sangue cairá sobre eles.
Nesse
versículo Deus condena o homem que se deitar com a mulher de seu pai à morte.
Tanto o homem como a mulher deveriam pagar com a própria vida por essa
transgressão. Se a mulher descrita neste versículo é a mãe do homem em questão,
ou outra mulher, isto é, sua madrasta; ou se esse fato aconteceu estando seu
pai ainda vivo ou depois que o pai já havia morrido; ou se após a morte do pai,
estando a mulher noiva ou novamente casada, pouco importa. De acordo com a
tradição judaica esse ato, fosse
qual fosse a condição da mulher, constituía-se em uma evidente violação da lei
de Deus conforme o que estava estabelecido em —
Levítico
18:18
Não
descobrirás a nudez da mulher de teu pai; é nudez de teu pai.
Todavia
devemos sempre enfatizar que tradições judaicas não são norma para nada que
diga respeito aos cristãos.
Essa
interpretação como vista acima está amparada por duas situações que podemos
caracterizar como interessantes, porém não normativas. A primeira é uma citação
que encontramos no assim chamado “Livro dos Jubileus”. Esse livro foi escrito
por um fariseu durante o pontificado de João Hircano como sumo sacerdote, entre
os anos de 135 a.C. e 105 a.C. O livro pertence a uma coleção de escritos
conhecidos como “pseudoeipigráficos” — escrito que contém título falso, ou nome
falso de autor. O livro pertence a essa coleção porque o autor atribui a
autoria a Deus mesmo como parte da revelação que Deus deu a Moisés no Sinai.
Nesse livro existe uma passagem que elabora de forma significativa sobre aquilo
que lemos em Levítico 20:11. O texto diz:
E novamente está escrito: Maldito
seja aquele que se deitar com a mulher de seu pai porque ele terá descoberto a
nudez de seu pai; e todos os santos do Senhor disseram ‘que assim seja, que
assim seja’. E você Moisés, ordene aos filhos de Israel que obedeçam a estas
palavras, pois as mesmas permitem a pena capital; este ato é impuro e não
existe substituto — morte no lugar de — para substituir aquele que cometeu tal
pecado, mas o mesmo deve ser morto por apedrejamento e desarraigado do meio do
povo do nosso Deus.
É óbvio que
nosso autor fariseu tirou de seu legalismo exagerado, conclusões precipitadas
quando afirma que não existe substituto para esse pecado. Sabemos que esse
pecado não é o pecado imperdoável mencionado por Jesus, mas ele ainda pode ser
nosso pecado para a morte. O Novo Testamento tem um exemplo de uma situação exatamente
como a mencionada em Levítico 18:8. Vamos ver como o apóstolo Paulo e a igreja
em Corinto resolveram esta questão. Paulo escreve:
1 Coríntios 5:1 – 13
Geralmente, se ouve que há entre
vós imoralidade e imoralidade tal, como nem mesmo entre os gentios, isto é,
haver quem se atreva a possuir a mulher de seu próprio pai. E, contudo, andais
vós ensoberbecidos e não chegastes a lamentar, para que fosse tirado do vosso
meio quem tamanho ultraje praticou? Eu, na verdade, ainda que ausente em
pessoa, mas presente em espírito, já sentenciei, como se estivesse presente,
que o autor de tal infâmia seja, em nome do Senhor Jesus, reunidos vós e o meu
espírito, com o poder de Jesus, nosso Senhor, entregue a Satanás para a
destruição da carne, a fim de que o espírito seja salvo no Dia do Senhor Jesus.
Não é boa a vossa jactância. Não sabeis que um pouco de fermento leveda a massa
toda? Lançai fora o velho fermento, para que sejais nova massa, como sois, de
fato, sem fermento. Pois também Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi imolado. Por
isso, celebremos a festa não com o velho fermento, nem com o fermento da
maldade e da malícia, e sim com os asmos da sinceridade e da verdade. Já em
carta vos escrevi que não vos associásseis com os impuros; refiro-me, com isto,
não propriamente aos impuros deste mundo, ou aos avarentos, ou roubadores, ou
idólatras; pois, neste caso, teríeis de sair do mundo. Mas, agora, vos escrevo
que não vos associeis com alguém que, dizendo-se irmão, for impuro, ou
avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com esse tal,
nem ainda comais. Pois com que direito haveria eu de julgar os de fora? Não
julgais vós os de dentro? Os de fora, porém, Deus os julgará. Expulsai, pois,
de entre vós o malfeitor.
A igreja em
Corinto, incentivada e admoestada pelo apóstolo Paulo tomou certas
providências, não sabemos exatamente quais, que levaram esse homem a se
arrepender de seu pecado e, na sua segunda epístola aos Coríntios, Paulo os
exorta a que recebam de volta o homem arrependido. Paulo escreve:
2 Coríntios 2:5—11
Ora, se alguém causou tristeza,
não o fez apenas a mim, mas, para que eu não seja demasiadamente áspero, digo
que em parte a todos vós; basta-lhe a punição pela maioria. De modo que deveis,
pelo contrário, perdoar-lhe e confortá-lo, para que não seja o mesmo consumido
por excessiva tristeza. Pelo que vos rogo que confirmeis para com ele o vosso
amor. E foi por isso também que vos escrevi, para ter prova de que, em tudo,
sois obedientes. A quem perdoais alguma coisa, também eu perdôo; porque, de
fato, o que tenho perdoado (se alguma coisa tenho perdoado), por causa de vós o
fiz na presença de Cristo; para que Satanás não alcance vantagem sobre nós,
pois não lhe ignoramos os desígnios.
Como podemos
ver que, em um primeiro instante parecia não haver saída para o homem
transgressor a não ser ter seu corpo físico destruído — morto — de tal maneira
que sua alma pudesse ainda ser salva. É evidente que da perspectiva de Paulo esse
era um pecado que conduziria o transgressor à morte. Por outro lado nós vemos
que existe perdão para esse pecado, quando o pecador é confrontado e se
arrepende. Nesse caso o mesmo deve ser acolhido, amparado e fortalecido pela
igreja.
Agora vamos
assumir, por um momento, que o pecado para a morte fosse o ato de um homem
deitar com a mulher de seu pai em quaisquer condições, estaria João pensando
nas palavras de Paulo quando disse “mas, agora, vos escrevo que não
vos associeis com alguém que, dizendo-se irmão, for impuro” ao recomendar que não se fizessem orações
a favor de tal pessoa, pois ela havia cometido um pecado que, certamente,
conduziria à morte do corpo físico. É possível, mas muito pouco provável!
Ainda na sua
primeira epístola à igreja em Corinto, Paulo menciona o fato de que a
participação na assim chamada ceia do Senhor — ver 1 Coríntios 11:20 — de modo
indigno, é a responsável pelo fato de muitos cristãos estarem já dormindo, que
é um eufemismo para a morte —
1 Coríntios 11:27—30
27 Por isso, aquele que comer o
pão ou beber o cálice do Senhor, indignamente, será réu do corpo e do sangue do
Senhor.
28 Examine-se, pois, o homem a si
mesmo, e, assim, coma do pão, e beba do cálice;
29 pois quem come e bebe sem
discernir o corpo, come e bebe juízo para si.
30 Eis a razão por que há entre
vós muitos fracos e doentes e não poucos que dormem.
Assim temos
que participar de modo indigno da ceia do Senhor era também um pecado que
conduzia à morte física. Estaria esse ato no pensamento de João quando ele usou
a expressão “há pecado para morte”?
Temos ainda
no Novo Testamento o caso de Ananias e Safira que perderam a vida por mentirem
ao Espírito Santo ou em outras palavras, por haverem pretendido fazer o que não
estavam fazendo de fato —
Atos 5:1—11
1 Entretanto, certo homem,
chamado Ananias, com sua mulher Safira, vendeu uma propriedade,
2 mas, em acordo com sua mulher,
reteve parte do preço e, levando o restante, depositou-o aos pés dos apóstolos.
3 Então, disse Pedro: Ananias,
por que encheu Satanás teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo,
reservando parte do valor do campo?
4 Conservando-o, porventura, não
seria teu? E, vendido, não estaria em teu poder? Como, pois, assentaste no
coração este desígnio? Não mentiste aos homens, mas a Deus.
5 Ouvindo estas palavras, Ananias
caiu e expirou, sobrevindo grande temor a todos os ouvintes.
6 Levantando-se os moços,
cobriram-lhe o corpo e, levando-o, o sepultaram.
7 Quase três horas depois, entrou
a mulher de Ananias, não sabendo o que ocorrera.
8 Então, Pedro, dirigindo-se a
ela, perguntou-lhe: Dize-me, vendestes por tanto aquela terra? Ela respondeu:
Sim, por tanto.
9 Tornou-lhe Pedro: Por que
entrastes em acordo para tentar o Espírito do Senhor? Eis aí à porta os pés dos
que sepultaram o teu marido, e eles também te levarão.
10 No mesmo instante, caiu ela
aos pés de Pedro e expirou. Entrando os moços, acharam-na morta e, levando-a,
sepultaram-na junto do
marido.
11 E sobreveio grande temor a
toda a igreja e a todos quantos ouviram a notícia destes acontecimentos.
Seria a
pretensão ou o mentir ao Espírito Santo ao que João estava se referindo quando
mencionou o “pecado para a morte”?
Todas as
passagens que vimos tratam de forma específica de morte física. Mas precisamos
definir se João estaria se referindo à morte física ou morte espiritual?
Deixemos que o apóstolo mesmo nos ajude. O próprio João usou a expressão “para morte” em João 11:4 para se
referir de modo preciso à morte física:
Ao receber a notícia, disse
Jesus: Esta enfermidade não é para morte, e sim para a glória de Deus, a fim de
que o Filho de Deus seja por ela glorificado.
Se João estava se referindo à morte física
na sua primeira epístola, então o que ele estaria querendo dizer seria uma
palavra desencorajando a oração por qualquer pecado que conduza o pecador à
morte física — seja ele o deitar com a mulher de seu pai, o participar
indignamente da ceia do Senhor, ou mentir ao Espírito Santo ou pretender ser
aquilo que não se é. Temos que nos lembrar que Jesus mesmo prometeu que:
João 8:51
Em verdade, em verdade vos digo:
se alguém guardar a minha palavra, não verá a morte, eternamente.
João 11:26
Todo o que vive e crê em mim não
morrerá, eternamente.
E não
podemos nos esquecer que João diz literalmente que:
Se alguém vir a seu irmão cometer
pecado não para a morte.
Todos
estamos sujeitos à morte física, mais cedo ou mais tarde. Isto é válido tanto
para os santos — os crentes — bem como para os ímpios — os pecadores. Mas como
vimos, os santos não morrerão eternamente, os ímpios sim, irão morrer eternamente.
Assim, temos
que entender que a primeira parte de 1 João 5:16 está tratando de crentes
genuínos que podem ser alcançados pela oração de outro crente, enquanto o mesmo
não é verdade para aqueles que cometem o “pecado para
a morte”.
CONTINUA
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Alexandros Meimaridis
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