Bandeiras com as palavras "Paz"
O artigo abaixo foi publicado
pela Revista Carta Capital e é de autoria do jornalista Vladimir Safatle.
Política
Análise / Vladimir Safatle
Israel e o Hamas
Condenar os ataques a Gaza não significa
defender os propósitos do grupo palestino
por
Vladimir Safatle
A melhor
defesa de Israel é dar aos palestinos aquilo que lhes é de direito. Mas ele não
pode fazê-lo, pois significaria entrar em rota de colisão com o núcleo
religioso-nacionalista de sua sociedade, entre outras, um Estado israelense até
as margens do Rio Jordão.
Gostaria
de voltar ao tema do conflito Israel-Palestina. Compartilho com o leitor de
Carta Capital um fato pessoal que creio contribuir para a discussão. Há poucos
dias escrevi um artigo no qual classifico de patética a recusa do governo
israelense em dialogar com um governo palestino que inclua o Hamas.
Desqualificar o Hamas como grupo “terrorista” (usei o termo sempre entre aspas,
mas alguns, creio, não sabem o significado de duas aspas a envolver uma
palavra) era cômico, vindo de um país que teve até um primeiro-ministro
(Menachem Begin) chamado de “terrorista” por intelectuais judeus, entre eles
Hannah Arendt e Albert Einstein, por sua participação em atentados e massacres
sob a bandeira do Irgun. Escrevi ainda que os palestinos negociam com grupos
que não reconhecem o direito de existência de um Estado palestino (como o partido Likud, de Benjamin Netanyahu, cuja carta-programa não
reconhece a existência da Palestina), então
não havia razão para Israel se recusar a negociar com o Hamas.
Poderia
lembrar ainda não ser possível a Israel aplicar o argumento de direito à
segurança quando fala de foguetes enviados de território ocupado ilegalmente.
Melhor seria evocar o direito de resistência de povos oprimidos contra
situações de exceção. A melhor defesa de Israel é dar aos palestinos aquilo que
lhes é de direito. Mas ele não pode fazê-lo, pois significaria entrar em rota
de colisão com o núcleo religioso-nacionalista de sua sociedade que defende,
entre outras, um Estado israelense até as margens do Rio Jordão.
A última
vez que se tentou algo nesse sentido, um primeiro-ministro israelense (Yitzhak
Rabin) foi assassinado... por um colono judeu. O que aconteceria se o governo
de Israel quisesse desalojar os 520 mil colonos trancados na Cisjordânia em
verdadeiras fortalezas, como Ariel, com metralhadoras Uzi a tiracolo? Avançar
em direção à criação de um Estado palestino cioso das fronteiras de 1967 é,
para o governo de Israel, quase um convite à guerra civil. A meu ver, isso
explica o fato de Israel estar pronto para fazer de tudo para continuar a fazer
nada. Seu governo não é capaz de confrontar o núcleo religioso que coloniza sua
própria sociedade. Nesse sentido, como disse anteriormente, o melhor sócio do governo israelense é o Hamas, pois ele
fornece a justificativa perfeita para sua política.
Sou
daqueles que acreditam que o governo brasileiro agiu de maneira exemplar ao
criticar as incursões militares em Gaza, sem citar o Hamas. Citá-lo seria, de
certa forma, desculpar o governo de Israel por seus atos, na linha: “É triste
todas essas mortes palestinas, mas o Hamas também provoca”. Tudo indica, porém,
não ser do Hamas a responsabilidade pelo assassinato dos três colonos judeus,
crime motivador do conflito atual. Mesmo se fosse, não se justificaria a
punição coletiva cega e, acima de tudo, a ocupação ilegal, colonial e com
práticas que lembram o apartheid sul-africano, como disse Andrew Felstein,
antigo parlamentar judeu do Congresso sul-africano, do território palestino.
Fiz
questão de lembrar que nada poderia servir para esquecer que o Hamas não é um aliado. Ao
contrário, trata-se de um grupo que
procura impor um modelo de sociedade religiosa demente e autoritária. O Hamas age para a libertação da Palestina e para sua
transformação em Estado islâmico. Que os palestinos queiram ter uma só voz e se
unir em uma situação de calamidade, deixando de lado a diferença entre seus
projetos futuros de sociedade a fim de se defender do puro e simples
desaparecimento, nada mais compreensível, racional e louvável. Agora, setores de esquerda acharem que podem, dessa forma, economizar
críticas ao Hamas e esquecer que sua existência é um dos motivos do atraso
político do mundo árabe, é ao meu ver imperdoável.
Por ter
chamado de “gato” um gato, fui acusado de ser “pró-israelense”. Quem acompanha
o que escrevo sobre o assunto na mídia nos últimos 15 anos só pode achar graça.
Isso apenas demonstra o nível canino de um debate no qual, como se costuma
dizer, o inimigo do meu inimigo aparece como meu amigo. Foi assim que certa
esquerda continuou, até ontem, a acreditar que Kaddafi e Assad mereciam defesa.
A
Primavera Árabe mostrou como povos da região não querem ser governados por
grupos religiosos, vide o destino da Irmandade Muçulmana e do tunisiano Nahda.
Os dois estão atualmente fora do governo. Cabe à
esquerda fazer a crítica implacável a esses grupos. Vale a pena lembrar que boa parte do fracasso atual da
revolta egípcia deve ser creditada na conta da Irmandade Muçulmana, que
conseguiu pavimentar o retorno dos militares ao poder.
O artigo original da Carta
Capital poderá ser visto por meio desse link aqui:
NOSSO COMENTÁRIO
Queremos agradecer o equilibrio
demonstrado pelo jornalista Vladimir Safatle e à Carta Capital na pessoa do seu
Editor Chefe, Mino Carta, pela coragem de confrontar todos os que se escondem
atrás das mais variadas máscaras — como se estivéssemos num carnaval em plena
Veneza — o que torna a leitura semanal da Carta Capital motivo de prazer e
reflexão.
OUTROS ARTIGOS SOBRE ISRAEL
Que Deus abençoe a todos.
Alexandros Meimaridis
PS. Pedimos a todos os nossos
leitores que puderem que “curtam” nossa página no Facebook através do seguinte
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Desde já agradecemos a todos.
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